13 de fevereiro de 2015

REDES CAUSAIS BAYESIANAS E A TEORIA PREFERIDA


O mundo não é uma fileira de dominós em que cada acontecimento causa exatamente um acontecimento e é causado por exatamente um acontecimento. O mundo é um tecido de causas e efeitos que se cruzam em padrões intricados. (...) Uma solução para a trama complexa de causação é uma técnica da inteligência artificial chamada Redes Causais Bayesianas. (Levam esse nome por causa de Thomas Bayes, cujo teorema homônimo mostra como calcular a probabilidade de determinada condição a partir de sua plausibilidade prévia e a chance de ela ter levado a determinado sintomas observados). Escolhe-se um grupo de variáveis (quantidade de café consumido, quantidade de exercício, presença de doença cardíaca e assim por diante), traçam-se setas entre causas e seus efeitos e rotula-se cada seta com um número representando a intensidade da influência causal (o aumento ou diminuição da probabilidade de o efeito ocorrer, dada a presença da causa). As setas podem estar em qualquer padrão, convergente, divergente ou circular, se necessário; não há necessidade de identificar "a" causa para determinado efeito. Com esse diagrama em mãos, e medições das variáveis (como quantas xícaras de café uma pessoa bebe), um computador pode acionar a aritmética e prever os efeitos de uma determinada causa (como o risco aumentado de doença cardíaca) ou, na outra direção, a probabilidade de uma causa estar presente, considerando seus efeitos típicos.
 
Por exemplo, uma Rede Causal Bayesiana típica permitiria que você conjecturasse, a partir do fato de um alarme anti-roubo disparar na casa do vizinho, que provavelmente houve um arrombamento, mas, se você também vir um gato circulando do lado de dentro, colocará o telefone de volta no gancho sem ligar para a polícia. Antes de usar uma Rede Causal Bayesiana, é preciso estabelecê-la, e isso pode ser feito a partir de algumas hipóteses iniciais sobre as variáveis e a relação entre elas, um grupo de intervenções experimentais (como privar pessoas de café e observar o que acontece com a saúde delas) ou um grupo de medições de como os fatores se correlacionam dentro de um grande conjunto de dados. As Redes Causais Bayesianas são uma excelente maneira de pensar em causas e efeitos a partir da informação sobre suas intercorrelações, e sob certos aspectos já foi demonstrado que as pessoas se ajustam a suas idéias, como no cenário com o gato e o alarme anti-roubo. Mas no fundo é Hume com um computador. Elas descrevem o raciocínio causal como algo que é resultado de um enorme conjunto de correlações, sem a preocupação com o que significam essas variáveis, ou que mecanismos no mundo permitem que os referenciais dessas variáveis na vida real influenciem uns aos outros. É algo que se aplica perfeitamente a um observador sentado diante de um imenso mostrador de luzes coloridas, que presta atenção para ver se a luz vermelha no canto superior direito tende a acender alguns minutos antes de uma luz verde na fileira do meio, a menos que um quadro amarelo no canto inferior esquerdo pisque duas vezes nesse ínterim.

Elimina, portanto, um componente crucial de nosso pensamento causal: a intuição de que o mundo é feito de mecanismos e forças com poderes causais - algum tipo de empurrão, energia, ou atração que é transmitido da causa para o efeito - e de que as correlações que observamos são o resultado da ação desses poderes. Até uma rápida olhada no comportamento humano já sugere que as pessoas freqüentemente pensam na causação como forças ocultas, em vez de meras correlações. Muitos experimentos psicológicos já mostraram que, quando as pessoas têm uma teoria preferida sobre como as coisas funcionam (como a de que o clima úmido causa dor de artrite), elas juram enxergar essas correlações no mundo, mesmo quando os números mostram que as correlações não existem nem nunca existiram. (...) Nossas intuições causais, lá no fundo, não passam de expectativas marcadas pelas experiências, e essas expectativas só são satisfeitas se o universo obedecer a leis, uma hipótese brutal que não conseguimos provar. (...) O hábito de inventar por alucinação forças causais e obrigar a experiência a se encaixar nelas vem moldando as culturas humanas desde tempos imemoriais, produzindo o vasto compêndio de vodu, astrologia, magia, oração, idolatria, panacéias da Nova Era e outras bobagens de nossa espécie.

Steven Pinker (Do Que é Feito o Pensamento; págs: 244, 250, 251 e 252)

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