31 de dezembro de 2020

MINHAS SENSAÇÕES

A única realidade para mim são as minhas sensações. Eu sou uma sensação minha. Portanto nem da minha própria existência estou certo. Posso está-lo apenas daquelas sensações a que eu chamo minhas. A verdade? É uma coisa exterior? Não posso ter a certeza dela, porque não é uma sensação minha, e eu só destas tenho a certeza. Uma sensação minha? De quê? Procurar o sonho é pois procurar a verdade, visto que a única verdade para mim sou eu próprio. Isolar-me tanto quanto possível dos outros é respeitar a verdade. Toda a metafísica é a procura da verdade, entendendo por Verdade a verdade absoluta. Ora a Verdade, seja ela o que for, e admitindo que seja qualquer coisa, se existe, existe ou dentro das minhas sensações, ou fora delas ou tanto dentro como fora delas. Se existe fora das minhas sensações, é uma coisa de que eu nunca posso estar certo, não existe para mim portanto, é, para mim, não só o contrário da Certeza, porque só das minhas sensações estou certo, mas o contrário de ser, porque a única coisa que existe pra mim são as minhas sensações. De modo que, a existir fora das minhas sensações, a Verdade é para mim igual à Incerteza e não-ser – não existe e não é a verdade, portanto. Mas concedamos o absurdo de que as minhas sensações possam ser o erro, e o não-ser (o que é absurdo, visto que elas, com certeza, existem) – nesse caso a verdade é o ser e existe fora das minhas sensações totalmente.

Mas a ideia Verdade é uma ideia minha; existe, por isso, dentro das minhas sensações: portanto, no que Verdade abstrata e fora de mim, a verdade existe dentro de mim – contradição, portanto; e erro, consequentemente. A outra hipótese é que a verdade existe dentro das minhas sensações. Nesse caso ou é a soma delas todas, ou é uma delas, ou parte delas. Se é uma delas, em que se distingue das outras? Se é uma sensação, não se distingue essencialmente das outras, e, para que se distinguisse, era preciso que se distinguisse essencialmente. E se não é uma sensação, não é uma sensação. – Se é parte das minhas sensações, que parte? As sensações têm duas faces – a de serem sentidas e a de serem dadas como coisas sentidas, a parte pela qual são minhas e a parte pela qual são de “coisas”. É uma destas partes, que a Verdade, a ser parte das minhas sensações, tem de ser. (Se é de qualquer modo um grupo de sensações unificando-se ao constituir uma só sensação, cai sob a garra do raciocínio que conduz à hipótese anterior.) Se é uma das duas faces – qual? A face “subjetiva”? Ora essa face subjetiva aparece-me sob uma de duas formas – ou a da minha “individualidade” una ou a de uma múltipla individualidade “minha”. No primeiro caso é uma sensação minha como qualquer outra e já fica refutada no argumento anterior. No segundo caso, essa verdade é múltipla e diversa, é verdades - o que é contraditório com a ideia de Verdade, valha ela o que valer. Será então a face objetiva? O mesmo argumento se aplica, porque ou é uma unificação dessas sensações numa ideia de um mundo exterior – e essa ideia ou não é nada ou é uma sensação minha, e se é uma sensação, já fica refutada essa hipótese; ou é de um múltiplo mundo exterior, e isso reduz-se às minhas sensações, então pluralidade de modos é a essência da ideia de Verdade.

Resta analisar se a Verdade é o conjunto das minhas sensações. Essas sensações ou são tomadas como uma ou como muitas. No primeiro caso voltamos à já rejeitada hipótese. No segundo caso a Verdade como ideia desaparece, porque se consubstancia com a totalidade das minhas sensações. Mas para ser a totalidade das minhas sensações, mesmo concebidas como minhas sensações, nuamente, a verdade fica dispersa – desaparece. Porque, ou se baseia na ideia de totalidade, que é uma ideia (ou sensação) nossa, ou não se apoia em parte nenhuma. Mas nada prova, mesmo, a identidade de verdade e totalidade. Portanto, a verdade não existe. Mas nós temos a ideia... Temos, mas vemos que não corresponde a “Realidade” nenhuma, suposto que realidade significa qualquer coisa. A Verdade é, portanto, uma ideia ou sensação nossa, não sabemos de que, sem significado, portanto sem valor, como qualquer outra sensação nossa. Ficamos, portanto, com as nossas sensações por única “realidade”, realidade que “realmente” até tem aqui certo valor, mas é uma conveniência para frasear. De “real” temos apenas as nossas sensações, mas “real” (que é uma sensação nossa) não significa nada, nem mesmo “significa” significa qualquer coisa, nem “sensação” tem um sentido, nem “tem um sentido” é coisa que tenha sentido algum. Tudo é o mesmo mistério. Reparo, porém, em que nem tudo pode significar coisa alguma, ou “mistério” é palavra que tenha significação.

Fernando Pessoa (O Livro do Desassossego; págs: 458, 459 e 460)

BUGS

Os bugs eram a coisa mais irritante na programação de computadores. Como os computadores seguem ordens minuciosas de operação, qualquer erro mínimo geralmente traz enormes consequências. Pequenos erros – como,  por exemplo, quando um programador digita uma vírgula em vez de um ponto - podem fazer sistemas inteiros parar. Susan sempre achou engraçado a origem da palavra bug, que significa, literalmente, inseto. O termo originou-se do primeiro computador do mundo, o Mark I, construído em 1944 em um laboratório da Universidade de Harvard. Ocupava uma sala inteira e era um labirinto de cabos conectando válvulas e circuitos eletromecânicos. Quando estava em operação, surgiu um erro persistente, e ninguém conseguia descobrir a causa. Após horas de pesquisas, um assistente de laboratório finalmente solucionou o problema. Aparentemente uma mariposa havia pousado em uma das placas do computador e, tendo morrido pelo choque elétrico, criou um curto-circuito. A partir de então, os erros de computador passaram a ser frequentemente chamados de bugs.

Dan Brown (Fortaleza Digital; pág: 113)

23 de dezembro de 2020

PERVERSÕES DA CIVILIZAÇÃO

A qualidade da civilização depende de um balanço de corpo, mente e espírito de seu povo, medido por uma escala menos humana que divina”. Ele advertia que a ciência havia se tornado tanto uma vítima de seus técnicos quanto a religião de seus fanáticos, que, assim como “as verdades espirituais de Cristo e Lao-tsé foram pervertidas exploração temporal de crentes cristãos e taoístas, as verdades intelectuais de grandes cientistas estavam sendo pervertidas pela exploração material da indústria e da guerra. Hiroshima esteve tão distante da intenção do cientista puro quanto a Inquisição, do Sermão da Montanha.”

A. Scott Berg (Lindbergh: uma biografia; págs: 597 e 598)

20 de dezembro de 2020

DE PAI PARA FILHO

Queen (Father To Son)

TRILHA INVESTIGATIVA

 

Desde a primavera de 1932, o técnico em madeira Arthur Koehler vinha analisando a escada do seqüestro. Ele começou por desmontá-la completamente, numerando cada degrau e os corrimões. Diversos tipos de madeira – pinho, bétula, abeto – foram usados na construção da escada, cada um deles com suas marcas internas de anéis e nós e com suas próprias marcas externas da máquina que serrou a matéria-prima e das ferramentas usadas para construir a escada. Uma peça de madeira – identificada como “corrimão número 16” – era especialmente interessante porque tinha quatro buracos de pregos sem nenhuma conexão com a construção da escada e que, por isso, sugeriam utilização anterior. De um alburno inferior, sem nenhum sinal de envelhecimento causado por fenômenos climáticos, o corrimão dava a impressão de ter sido talhado em ambiente interno e usado para construção pesada, talvez numa garagem ou num sótão.

Havia dezenas de outras pistas que mantiveram Koehler na trilha investigativa. Os degraus dessa escada caseira, por exemplo, eram do suave pinho Ponderosa e não mostravam nenhum tipo de uso anterior, o que indicava que a escada havia sido construída para um emprego específico. As marcas deixadas nesses degraus pela plaina com que a madeira foi desbastada revelavam uma combinação incomum de tipos de corte. Koehler enviou cartas a 1600 marcenarias na Costa Leste perguntando se suas plainas tinham aquelas características. Respostas positivas vieram de 25 marcenarias, às quais se pediu que enviassem amostras de tábuas. Dentre elas, Koehler foi capaz de identificar a carpintaria Dorn Lumber, em McCormick, Carolina do Sul, como a fonte das tábuas que serviram para fazer os degraus da escada. Vinte e cinco carpintarias haviam comprado tábuas de Dorn Lumber desde o outono de 1929. Por meio de dedução científica, Koehler reduziu a lista até chegar à National Lumber and Millwork Company, do Bronx, que fizera uma encomenda em dezembro de 1931, três meses antes do seqüestro. Em novembro de 1933, após dezoito meses de investigação, Koehler precisava apenas dos comprovantes de venda da carpintaria do Bronx para chegar ao possível construtor da escada. Infelizmente, a National Lumber operava basicamente com papel-moeda e não mantinha esse tipo de contabilidade.

A. Scott Berg (Lindbergh: uma biografia; pág: 369)

17 de dezembro de 2020

OFFSHORES

 

Offshore, um termo que presta reverência aos velhos tempos dos corsários que saqueavam os mares e depositavam a pilhagem off-shore ou fora da costa. (...) Dificilmente uma offshore company movimenta milhões no mesmo paraíso em que está situada. Um exemplo: as contas dos doleiros do Banestado e de outros escritórios de lavagem de Nova York eram abertas sempre em nome de offshores nas ilhas Virgens Britânicas e em outros paraísos fiscais. Ou seja, embora situadas no Caribe, essas empresas centralizam suas operações em bancos dos Estados Unidos. (...) Mas por que o dinheiro devia fazer uma escala nos Estados Unidos antes de seguir caminho para os paraísos fiscais? Simplesmente porque, segundo a legislação internacional que rege as casas de custódias, toda operação financeira em dólar entre dois países distintos deve transitar pelos EUA (país da moeda-padrão) antes de seguir viagem. Isso explica porque mesmo as offshores abertas no Uruguai ou no Caribe centralizam suas operações financeiras em bancos norte-americanos. (...).

Qual o motivo que leva uma pessoa a abrir uma conta em um desses lugares? A isenção de impostos é algo tentador, mas os donos de offshores usam os paraísos fiscais principalmente como um biombo para proteger, manter suas identidades e ocultar dinheiro sem procedência. Como lembra o delegado federal Rodrigo Carneiro Gomes, a principal característica de uma offshore é a portabilidade de títulos de propriedade (o cotista aparece apenas como portador das cautelas da empresa), o que mantém os verdadeiros donos em uma zona de sombra. (...) Quando querem operar clandestinamente, principalmente em operações de repatriamento de dinheiro, os reais sócios das offshores aparecem apenas como procuradores de suas próprias firmas. No submundo da lavagem de dinheiro, as offshores funcionam como empresas-ônibus. São chamadas assim porque, grosso modo, só exercem a função de enviar e trazer dinheiro do exterior. Geralmente as procurações, em que os donos simulam serem somente representantes de suas próprias offshores, são assinadas pelos diretores dos escritórios especializados em abrir e operar esses empreendimentos. As escrituras são lavradas quase sempre em consulados brasileiros nos Estados Unidos ou no Panamá. Lá, o documento recebe o selo dos paraísos fiscais, que mantêm em segredo a identidade de quem está verdadeiramente por trás do negócio. As empresas são identificadas apenas pelo número de uma P.O. box, simplesmente uma caixa postal.

Com frequência, tais procurações são empregadas em operações nas quais os lavadores internam dinheiro de suas offshores em suas próprias empresas instaladas no Brasil. Disfarçadas como investidores estrangeiros, as offshores passam a adquirir cotas de firmas de seus próprios donos no Brasil. Como tudo não passa de um jogo de cena, a compra e venda pode ser marcada por aberrações e esquisitices. Não são raros os casos em que uma mesma pessoa assina, ao mesmo tempo, nas duas pontas dessas transações: como procuradora da fora da costa e na condição de dona da empresa situada no Brasil, que passa a receber recursos de sua sócia no paraíso fiscal.

Amaury Ribeiro Jr. (A Privataria Tucana; págs: 46, 47, 129 e 130)

ILLUMINATI

 

Por volta de 1500, um grupo de homens em Roma revidou e lutou contra a Igreja. Alguns dos homens mais esclarecidos da Itália – físicos, matemáticos, astrônomos – começaram a promover encontros secretos para discutir suas preocupações sobre os ensinamentos errados difundidos pela Igreja. Temiam que o monopólio da “verdade” pela Igreja ameaçasse a difusão dos conhecimentos acadêmicos pelo mundo afora. Fundaram o primeiro think tank científico do mundo, chamando a si mesmos de “os esclarecidos”. (...) Os Illuminati. (...) As mentes mais cultas da Europa... dedicadas à busca da verdade científica. (...) Os Illuminati eram caçados impiedosamente pela Igreja Católica. Somente através de ritos extremamente sigilosos é que os cientistas se mantinham seguros. Os rumores se espalharam pelo submundo acadêmico e a fraternidade dos Illuminati cresceu, incluindo cientistas de toda a Europa. Eles encontravam-se regularmente em Roma em um refúgio ultra-secreto a que chamavam de “Igreja da Iluminação”. (...) Até os que não pertenciam ao mundo científico conheciam o malfadado astrônomo que fora preso e quase executado pela Igreja por ter declarado que o Sol, e não a Terra, era o centro do sistema solar. Embora seus dados fossem irrefutáveis, o astrônomo fora severamente punido por insinuar que Deus não instalara a humanidade no centro de seu universo. Seu nome era Galileu Galilei. (...).

Galilei era um Illuminatus. E também um católico fervoroso. Tentou abrandar a posição da Igreja com relação à ciência proclamando que a ciência não prejudicava a noção da existência de Deus, mas, pelo contrário, reforçava-a. (...) sustentava que a ciência e a religião não eram inimigas e sim aliadas, duas linguagens diferentes que contavam a mesma história. (...) Infelizmente, (...) a unificação da ciência e da religião não era o que a Igreja queria. (...) A união teria invalidado a pretensão da Igreja de ser o único veículo através do qual o homem poderia compreender Deus. Assim, a Igreja acusou Galileu de heresia, condenou-o e colocou-o em prisão domiciliar permanente. (...) A prisão de Galileu causou uma convulsão entre os Illuminati. Cometeram alguns erros e a Igreja descobriu as identidades de quatro membros, que foram capturados e interrogados. Mas os quatro cientistas nada revelaram, nem sob tortura. (...) Em seguida, os cientistas foram brutalmente assassinados e seus corpos lançados às ruas de Roma como advertência para os que ainda cogitassem se unir aos Illuminati. (...).

Os Illuminati mergulharam fundo na clandestinidade, onde começaram a se misturar a outros grupos que haviam fugido dos expurgos da Igreja Católica: místicos, alquimistas, ocultistas, muçulmanos, judeus. Ao longo dos anos, os Illuminati absorveram novos membros. Surgiu um outro tipo de Illuminati, mais soturno, profundamente anticristão. Tornaram-se muito poderosos, praticando ritos misteriosos, sigilo mortal e jurando um dia se erguerem outra vez e se vingarem da Igreja Católica. Seu poder cresceu a ponto de serem considerados a mais perigosa força anticristã do mundo. (...) Eliminar o catolicismo era o compromisso principal dos Illuminati. A fraternidade sustentava que os dogmas supersticiosos impostos pela Igreja eram os maiores inimigos da humanidade. Temia que o progresso científico cessasse de vez caso a Igreja continuasse a promover mitos piedosos como se fossem fatos absolutos, e que dessa forma a humanidade fosse condenada a um futuro sem perspectivas, com guerras santas sem o menor sentido. (...).

Os Illuminati ficaram mais poderosos na Europa e voltaram a atenção para a América, cujo governo ainda novato tinha maçons como líderes – George Washington, Benjamin Franklin -, homens honestos, tementes a Deus, que ignoravam que a sociedade maçônica era o reduto dos Illuminati. Estes aproveitaram a possibilidade de infiltração a ajudaram a fundar bancos, universidades e indústrias para financiar a realização de seu objetivo máximo. (...) A criação de um único estado mundial unificado, uma espécie de Nova Ordem Mundial secular. (...) Baseada em conhecimentos científicos, em um novo Iluminismo. Chamavam-na de Doutrina Luciferiana. A Igreja alega que Lúcifer era uma referência ao demônio, mas a fraternidade insistia que sua intenção era o significado literal da palavra, em latim, aquele que traz a luz. Ou Iluminador.

Dan Brown (Anjos e Demônios; págs: 37, 38 e 42)

16 de dezembro de 2020

"DO PÓ VIESTES, AO PÓ VOLTARÁS"

Decidira havia tempos que a morte era um simples fim, o término de qualquer tipo de consciência, o pó voltando implacavelmente ao pó. Essa filosofia alimentara seu egocentrismo. Ele se sentia justificado por cuidar da própria pele, controlando não só sua vida, mas também a dos outros em benefício próprio. Não havia certo e errado, assim como nenhuma verdade absoluta, apenas normas sociais regidas por leis e comportamentos gerados por algum sentimento de culpa. A morte, tal como ele a concebia, significava que nada realmente importava. A vida era um suspiro evolucionário sem sentido, a sobrevivência temporária do mais inteligente ou engenhoso. Dali a mil anos, se a raça humana sobrevivesse, ninguém saberia que ele havia existido nem se importaria com a maneira como levara a vida.

William P. Young (A Travessia; pág: 28)

CIÚME

Com o tempo aprendi que o ciúme é um sentimento para proclamar de peito aberto, no instante mesmo de sua origem. Porque ao nascer, ele é realmente um sentimento cortês, deve ser logo oferecido à mulher como uma rosa. Senão, no instante seguinte ele se fecha em repolho, e dentro dele todo o mal fermenta. O ciúme é então a espécie mais introvertida das invejas, e mordendo-se todo, põe nos outros a culpa da sua feiura.

Chico Buarque (Leite Derramado; págs: 61 e 62)

8 de dezembro de 2020

ADAPTAÇÃO

As instituições da ordem dialogam com (...) mecanismos do ego que, diante do real como impossibilidade, empurram o indivíduo para a adaptação. O preço da passagem subiu, a inflação corrói meu salário, mas o que podemos fazer? Racionalizo por meio de uma série de meios, buscando nos jornais e na televisão uma explicação: desloco minha raiva e, não podendo brigar com o “sistema”, sem rosto visível, brigo com o primeiro que me provoca, ironizo com piadas, fujo da realidade pelas portas de escape disponíveis na TV a cabo, no primeiro templo que me chama à salvação, no videogame, nas substâncias lícitas ou não que me transportem para fora da realidade. Nessas mediações, portanto, os indivíduos vivem a revolta ou buscam a adaptação no interior da serialidade.

Mauro Luis Iasi (Cidades Rebeldes; pág: 43)


Nando Reis e Arnaldo Antunes (Não Vou Me Adaptar - Ao Vivo em São Paulo)

6 de dezembro de 2020

PUBLICITÁRIOS E JORNALISTAS VÃO PARA O INFERNO?

 The Architect (Matrix)

Há uma piada entre a turma da comunicação que faz insinuações em relação a publicitários e jornalistas. A piada - se é que poderíamos assim chamar - conta que publicitários, diante do único mal irremediável, sabem que vão para o inferno [lembra-te do teu "deus"] e que jornalistas não sabem, que também vão.. [não esqueça-te do teu "deus"] O que acho interessante nessa insinuação é que há, por trás, uma verdade que mostra um pouco da postura desses profissionais diante da realidade, ou com o que consideram fatos. Vale ressaltar se tratar aqui de uma visão caricata das profissões. Tá? Envolve estigmas ou estereótipos, talvez pejorativos, que o próprio desempenhar da função parece expressar subjetivamente. Isso, em alguns casos, claro. Não deixemos de honrar as digníssimas exceções que certamente irão para o céu, sem perder tempo no purgatório. Quem atua na área há de reconhecer alguns dos traços comentados logo abaixo. Amém.. Mas vamos ao que interessa, ao qual nada tem a ver com religião, mas com cosmovisão.

Publicitários, pela própria natureza do ofício, conservam um certo caráter sofista e com isso uma potencial relativização dos fatos. Não lidamos, somente, com a verdade concreta, mas, antes de mais nada, jogamos e interagimos com a realidade percebida, afinal, a verdade - para todos os efeitos - é tudo aquilo que acreditamos ser verdade. Assim, entramos na onda e nos relacionamos criativamente com os fatos, desejos e aspirações por trás do que se entende sobre a realidade. A grosso modo, como os sofistas, para os publicitários, a realidade, até certo ponto, é relativa. Ou seja, um prato cheio para se construir mundos através das tais narrativas se valendo de toda cor, tom, formas, sons, representações, simbologias, etc. As aulas de semiótica, psicologia do consumidor e, sobretudo, neuromarketing já dão conta de ensinar, aos aspirantes ao fantástico mundo da publicidade, que a forma que o indivíduo percebe e se relaciona com a realidade tem mais a ver com toda sorte de viés de confirmação ou distorção cognitiva, do que de fatos. Nesse terreno nos valemos de todo aparato que possa ter uso para fins de comunicação, no intuito de atrair, persuadir, convencer, influenciar, etc. Não é raro criar-se um certo cinismo ou ceticismo quando a discussão é sobre a realidade, porque isso, a princípio, vai variar de acordo com o target. Ok?

Já os jornalistas têm, devido a própria natureza do ofício, pretensões de encontrar verdades absolutas. (o que me faz crer que quem criou a piada deve ter sido algum publicitário..). Busca-se as melhores fontes de informações; investiga-se, muitas das vezes, com a melhor das intenções; busca-se anunciar ao mundo sobre uma verdade que é verdadeira mesmo. Bom.. O resultado é que devido a uma certa falta de ceticismo diante dos inputs que nos permitem ir montando o quadro da realidade, jornalistas baixam a guarda para os potenciais vieses que todos nós carregamentos em si, em um grau ou outro, ao qual se impõem no julgamento na ausência de um policiamento frio da racionalidade. Por isso, cria-se, uma certa ilusão de se estar mais perto dos fatos, ou da realidade, que os demais mortais. É precisamente tal ilusão que os fazem crer que "não irão para o inferno", sobretudo, tão certos de serem bem intencionados em sua nobre missão de fazer com que todos saibam a verdade verdadeira. Não é raro uma certa arrogância, quanto ao entendimento dos fatos, quando você se julga em posse das melhores informações. Certo?

Por fim, não há como negar que boa parte do que vemos na mídia - um mundo arquitetado por comunicólogos - carregam doses de cinismo e arrogância por trás de suas articulações, e quanto à isso, gregos e troianos - em nome da tragédia - concordam. Seja lá no que seja, haverá sempre os melhores profissionais tanto no lado A, quanto no B, e, claro, julgando-se - cada um - sempre estarem no lado certo da história, no entanto, uns mais convictos do que outros, seja por cinismo ou por arrogância. Mas "brincadeiras" à parte.. Permitam-me, como publicitário, anunciar que, segundo a lenda, não existe inferno, ou céu. E nem Papai Noel...

Diego Cosmo

3 de dezembro de 2020

DENTRO DE VOCÊ

Descobri que somos nós que, com nossas atitudes, atraímos todos os acontecimentos e situações que vivenciamos. Que, enquanto continuamos agarrados a elas, os fatos irão se repetindo. Descobrindo qual a atitude que está causando uma situação que não nos agrada, poderemos substituí-la por outra melhor e obter outros resultados. (...) Se quer melhorar sua vida, precisa assumir sua força, acreditar em sua capacidade, colocar sua dignidade acima do que os outros possam pensar. (...) Esqueça o que passou. Volte a ser o mesmo homem que era antes e logo verá que obterá de novo tudo quanto perdeu e até mais. (...) Não se culpe, para não piorar as coisas. Você precisa colocar sua força em coisas boas, que melhorem sua vida. A culpa, além de dispersar suas energias, ainda o empurra para o pessimismo. A condenação não ajuda em nada, só atrapalha. (...) A depressão, a queixa, a falta de confiança na vida, isso afasta todas as oportunidades boas. (...) A vida não castiga. Apenas ensina. De acordo com suas atitudes, ela responde com desafios que abrem a consciência e fazem amadurecer. (...) Se prestar atenção, perceberá que há coisas que abrem seu coração e o deixam de bem com a vida e há outras que provocam aperto dentro do peito e incomodam. (...) É assim que sua alma fala com você. Se deseja sentir-se bem, é só seguir esses sinais, valorizando e conservando tudo que o faz sentir-se melhor e não dando importância ao que o deprime. (...) Aliás, a felicidade é nosso maior objetivo. Como acha que alcançaremos tudo isso sem conquistar a sabedoria? E, para conquistar a sabedoria, precisamos desenvolver nossa força interior, aprender a lidar com as leis da vida, nos harmonizarmos com elas. (...) Tudo é resultado das nossas atitudes. Mas, quando descobrimos quais as atitudes que não são boas e nos esforçamos para mudá-las, evitamos que o erro se repita. Aprendemos a lição e pronto. Tudo volta ao normal de forma melhor. (...) Olhe para trás não para julgar os outros mas para notar como você atraiu o sofrimento que a atormenta. A causa da sua dor está dentro de você, não fora.

Zibia Gasparetto (Ninguém é de Ninguém; págs: 41, 46, 55, 57, 78, 80, 116, 117, 218, 219 e 225)

2 de dezembro de 2020

CAPRICHO

Primeira edição (1952)

Capricho” foi a primeira revista brasileira a atingir, ultrapassar e a sustentar tiragens acima de meio milhão de exemplares mensais. (...) Quando levou “Capricho” àquelas alturas, Civita pensou que tinha nas mãos, finalmente, um veículo publicitário de grande aceitação. Ledo engano. (...) Como ainda não existia o IVC – Instituto Verificador de Circulação -, as agências levavam em conta as informações dos próprios editores. Havia entre eles o que se pode chamar de pacto de confiança. (...) O editor decidiu, então, montar uma estratégia para convencer as agências quanto à tiragem da revista. Idealizou uma operação de promoção publicitária razoavelmente barata, mas ousada e eficiente. Como “Capricho” era impressa à noite, ele e Rossi reuniram, numa badalada boate paulistana, os diretores de mídia das principais agências de publicidade de São Paulo e do Rio, com o pretexto de homenageá-los. No início da madrugada, os convidados foram convencidos a dar uma “passada” pela gráfica da Abril para uma rapidíssima visita. O momento escolhido por Civita era exatamente aquele em que a impressão atingia o ponto culminante. Ao verem as pilhas de revistas impressas e o marcador da rotativa ultrapassar a marca dos 600 mil exemplares impressos, os publicitários ficaram impressionados. E Civita aproveitou para perguntá-los se algum dia haviam sido convidados para assistir à impressão de “O Cruzeiro” ou de “Seleções” e verificar “in loco” se os números eram verdadeiros. A resposta foi negativa. O plano revelou-se eficiente. Logo, começou a fluir para a editora um volume maior de anúncios diversos, não apenas femininos, que iriam, em poucos meses, transformar “Capricho” em importante veículo publicitário.

Gonçalo Junior (O Homem Abril; págs: 98, 99 e 100)

1 de dezembro de 2020

LEI DE MOORE

 

Em 1965, os circuitos integrados abrigavam apenas algumas dezenas de transistores. Naquele ano, Gordon Moore, um dos fundadores da Intel, previu, por simples observação da evolução dos componentes, que os circuitos integrados dobrariam o número de transistores a cada ano. Depois, em 1971, retificou sua previsão para 18 ou 24 meses. Entre 1965 e 1975, a densidade dos circuitos integrados saltou de sessenta para 60 mil componentes. No período 1971-2001, a previsão de Gordon Moore se mostrou ainda mais precisa: os circuitos integrados haviam dobrado seu número de componentes a cada 1,94 ano. Ou seja: praticamente a cada dois anos. A previsão de Moore, totalmente intuitiva, revelou-se extremamente precisa. Em linguagem popular, ele acertou na mosca. Daí porque sua previsão ganhou o nome de Lei de Moore.

Ethevaldo Siqueira (Para Compreender o Mundo Digital; pág: 102)

TELEMARKETING

 

Na pesquisa de campo, observamos o manejo degradante dessa força de trabalho: porque a indústria de call center não necessita de trabalhadores qualificados, as empresas beneficiam-se de um regime fabril apoiado em elevadas taxas de rotatividade e no aprofundamento do sofrimento psíquico. As empresas exploram o ciclo do consumo da força de trabalho. Em geral, o teleoperador necessita de dois a três meses de experiência para se tornar proficiente no produto. Após esse tempo, o trabalhador encontra-se apto a alcançar as metas. Advém um período de aproximadamente um ano, em que ele obtém certa satisfação residual em razão de dominar o produto. No entanto, o endurecimento das metas, a rotinização, o despotismo dos coordenadores de operação, os baixos salários e a negligência por parte das empresas em relação à ergonomia e à temperatura do ambiente promovem o adoecimento e alimentam o desinteresse pela atividade. Nessa fase, o teleoperador deixa de “dar resultados”, sendo então demitido e substituído por outro, que recomeçara o mesmo ciclo.

Ruy Braga (Cidades Rebeldes; págs: 80 e 81)