30 de abril de 2019

HEURÍSTICA DE CONFIRMAÇÃO


Pense na heurística como uma regra prática: um atalho mental, aquilo que você obtém quando queima a mão em uma panela quente e aprende que não deve mais tocar em panelas quentes. Você não precisa mais se incomodar em testar essa hipótese; você conhece seu resultado. Heurísticas existem psicologicamente para você não ter mais de pensar sobre elas e possa gastar a energia de seu cérebro pensando em outra coisa. No entanto, Heurísticas têm um lado obscuro: fazem com que tenhamos tendências inconscientes em favor daquilo que nos é familiar e de escolher fazer as mesmas coisas que sempre fizemos, em vez de fazer algo novo que pode ser mais eficiente. Elas nos fazem efetuar saltos lógicos que conduzem a falsas conclusões. Por exemplo, esses atalhos mentais escoram nossa capacidade para o racismo, o sexismo, e outras formas de discriminação. Uma heurística prejudicial desse tipo é a tendência de confirmação. É a hipótese psicológica de que tão logo começamos a acreditar em algo, passamos inconscientemente a buscar informações que reforçam essa crença, mesmo na ausência de fatos. Aliás, nossa predisposição pode se tornar tão forte que fatos contrários acabarão fortalecendo nossas crenças equivocadas. (...) Os cientistas cognitivos Hugo Mercier e Dan Sperber viraram nossa capacidade de raciocínio de cabeça para baixo. Afinal, se toda evidência em torno do raciocínio mostra que, na realidade, não somos muito eficientes em utilizá-lo para tomar melhores decisões, então talvez essa não seja a principal função da razão. Em seu artigo "Why do humans reason?" (Por que humanos raciocinam?), eles argumentam que nossa capacidade de raciocínio faz exatamente o que pode ser esperado de um dispositivo argumentativo: ela procura argumentos que sustentam determinada conclusão e, ceteris paribus, favorece conclusões para as quais argumentos possam ser encontrados. Mercier e Sperber argumentam que nossa mente talvez tenha evoluído de modo a preferir a persuasão em vez da verdade. Isso é certamente plausível - seres humanos são animais sociais, e a persuasão é uma forma de poder social.

Em 2005, Drew Westen, professor da Universidade de Emory, e seus colegas recrutaram para um sofisticado teste 15 pessoas que se autodefiniam como firmes defensores do Partido Democrata e outras 15, defensores do Partido Republicano. Eles utilizaram uma máquina de imageamento de ressonância magnética funcional (functional Magnetic Resonance Imaging, ou fMRI) para estudar como eleitores partidários reagiam a comentários negativos sobre seus partidos ou candidatos. Westen e seus colegas descobriram que quando esses sujeitos processavam "informações emocionalmente ameaçadoras" acerca de seus candidatos preferidos, as partes do cérebro associadas ao raciocínio se desligavam e as partes responsáveis pelas emoções se acendiam. A pesquisa de Westen indica que quando nos tornamos suficientemente predispostos, perdemos a capacidade de mudar de opinião.

Já sabemos que comportamentos como a tendência de confirmação nos fazem buscar informações com que concordamos. Mas também é verdade que, assim que nos entrincheiramos em uma crença, os fatos não mudarão nossa opinião. (...) Não confiamos "nas notícias", mas confiamos em "nossas notícias"; em outras palavras, nas notícias em que queremos acreditar. Essa é uma arma muito mais potente do que nossa visão clássica da ignorância. (...) Nosso novo tipo de ignorância: uma que vem do consumo da informação, não de sua falta. (...) Quanto mais informada uma pessoa, mais firmes se tornam suas crenças; se elas estão ou não corretas, essa é uma questão totalmente diferente.

Clay A. Johnson (A Dieta Da Informação; págs: 66, 67, 68, 78, 81 e 82)


A verdade é que os fatos e a razão não têm muita influência sobre nossas decisões, exceto nas coisas triviais, como abastecer o carro quando o tanque está vazio. Em todas as coisas importantes, somos criaturas emocionais que primeiro decidem e depois racionalizam. (...) Podemos ser racionais em situações triviais - como decidir a que horas sair de casa para o trabalho. Mas quase nunca o somos quando se trata de questões relacionadas a amor, família, animais de estimação, política, ego, entretenimento e quase tudo o que nos importa emocionalmente. Quando nossos sentimentos estão envolvidos, nosso senso de razão se cala. (...) Tomamos decisões e só então criamos elaboradas racionalizações para elas.

A exceção à regra é quando não há conteúdo emocional em uma decisão e você tem todas as informações de que precisa. Nesses casos, podemos usar nossa capacidade racional. (...) Desde que você não tenha nenhum investimento emocional no assunto, a razão e os fatos podem ser bastante persuasivos. Quando você remove a emoção da decisão, razão e fatos são tudo o que tem para fazer com que prossiga. (...) Mas, no mundo real, a maioria dos tópicos é emocional. Somos emocionais a respeito de relacionamentos, carreira e política. E isso pode influenciar todas as outras coisas que fazemos. Por exemplo, se está em um relacionamento, é difícil comprar qualquer coisa importante sem considerar o impacto emocional que a compra terá em seu parceiro. Assim, mesmo nossas escolhas mais simples e objetivas adquirem dimensões emocionais em função das pessoas que nos cercam. (...) Quando se trata da decisão final, nosso senso de razão vai dar uma volta enquanto nossa mente irracional aplica nossos vieses, esperanças e medos à decisão.

Scott Adams (Ganhar de Lavada; págs: 50, 57, 58, 121 e 123)


"Todos os conhecimentos e hábitos adquiridos", escreveu Joseph Schumpeter, o grande teórico da inovação, "tornam-se tão enraizados em si mesmos como o sulco de uma via férrea no solo.Schumpeter acreditava que, em essência, nossas mentes são preguiçosas demais para buscar novas linhas de pensamento enquanto as antigas continuarem a servir. "A própria natureza de hábitos fixos de pensamento, sua função como poupadores de energia, se baseia no fato de eles se tornarem subconscientes, gerarem resultados de forma automática e serem à prova de críticas e até de contestação diante de acontecimentos individuais."

Tim Wu (Impérios da Comunicação; pág: 30)

RAÇÃO PARA AFIRMAÇÃO


Transparência não era a resposta universal que procurava. Você não pode simplesmente inundar o mercado com brócolis e esperar que as pessoas deixem de comer batatas fritas. Se um grande número de pessoas busca apenas informações que confirmem suas crenças, então inundar o mercado com dados sobre o governo não funcionará tão bem quanto os teóricos preveem. As informações acabarão distorcidas pelas máquinas de ruído de esquerda e direita e transformadas em mais "ração" para manter o país manipulado. (...).

Os mundos do consumo de alimentos e do consumo de informações não estão tão distantes assim: os campos da psicologia cognitiva e da neurociência mostram que informações podem ter efeitos fisiológicos sobre nossos corpos, assim como consequências relativamente graves e incontroláveis sobre nossa capacidade de tomar decisões. (...) Temos alguns tipos de informações que nos atraem naturalmente: afirmação é algo que todos gostamos de receber, e a confirmação de nossas crenças nos ajuda a formar comunidades fortes. (...) É um fardo cognitivo e de ego pesado demais nos cercarmos de pessoas das quais discordamos. (...) E aquilo que é pior para nós costuma ser mais barato de se fazer. (...) Assim como empresas alimentícias descobriram que se quiserem vender muitas calorias a preços baixos, devem empacotá-las com sal, gordura e açúcar - aquilo que todos desejam -, empresas de mídia aprenderam que afirmação vende muito mais do que informação. Quem deseja ouvir a verdade quando pode ouvir que está certo? (...).

Empresas alimentícias desejam fornecer-lhe o alimento mais lucrativo possível que o fará continuar comendo - o resultado disso são supermercados cheios de formas inimagináveis de produzir e consumir milho. Empresas de mídia desejam fornecer-lhe a informação mais lucrativa possível que o fará continuar sintonizado - o resultado disso são ondas aéreas repletas de medo e afirmação. São esses os produtos que fazem que os acionistas institucionais, donos dessas empresas, permaneçam felizes. (...) A afirmação daquilo em que você já acredita é o açúcar da mente. Uma dieta da informação saudável significa buscar a diversidade. (...) Significa afirmar nossas crenças apenas até certo ponto, ficar atento ao nosso próprio fanatismo e absorver o máximo de desafios que pudermos às nossas crenças. Receber perspectivas que concordam com você é uma coisa, mas receber apenas perspectivas desse tipo é ruim para você. (...).

Nossas empresas de comunicação não são neurocientistas, nem conspirativas. Não há nenhum plano elaborado que pretende afastar ou colocar os cidadãos uns contra os outros em jogos de azul contra vermelho. Um ponto de vista mais pragmático é pensar que nossa economia é orgânica. Por meio dos testes de tentativa e erro, nossas empresas descobriram o que desejamos e estão fornecendo isso para nós. Acontece que quanto mais disso elas nos oferecem, mais nós queremos. É como um loop de feedback de reforço automático. (...) A rede de tecnologia de personalização que descobre o que você deseja e continua lhe servindo isso, à custa daquilo que não lhe interessa. O resultado é diferente de quando realizamos testes A/B com base na opinião popular; essa personalização sistêmica pretende oferecer para nós o que nos é relevante.

Clay A. Johnson (A Dieta Da Informação; págs: 19, 21, 22, 52, 77, 84, 85 e 145)

25 de abril de 2019

SEITAS

Seitas funcionam porque conseguem que seus membros convertam as pessoas que os cercam ou que desprezem os infiéis como ateus. Elas são metódicas na criação de seu fechamento epistêmico, primeiro criando uma nova perspectiva para a visualização da realidade e depois fazendo com que alguém que tenha uma percepção diferente do mundo seja rotulado, pela ortodoxia, como herege (termo que tem origem na palavra grega para "escolha") ou como "agente morto" pela cientologia. A maioria das seitas modernas apresenta alguma classificação para aqueles que não partilham de suas crenças.
 
Clay A. Johnson (A Dieta Da Informação; págs: 94 e 95)
 
 
Uma religião universal possui seus descrentes ou hereges. A ciência tende a desqualificar as outras formas de saber, aquilo que ela chama de irracional.

Pierre Lévy (Cibercultura; pág: 246)

DIFERENÇAS ESTRUTURAIS ENTRE LIBERAIS E CONSERVADORES



Dr. Ryota Kanai e alguns de seus colegas no Instituto de Neurociência Cognitiva da University College London recrutaram indivíduos que se autodefiniam como liberais e conservadores e estudaram seu cérebro via fMRI. Eles descobriram algo incrível: os cérebros liberais apresentavam diferenças estruturais no córtex cingulado anterior - a região responsável pela empatia e pelo monitoramento de conflitos. Em contraste, estruturas de cérebros conservadores apresentavam amígdalas cerebrais direitas maiores - a parte do cérebro responsável por detectar expressões faciais ameaçadoras e responder agressivamente a situações de risco.

Clay A. Johnson (A Dieta Da Informação; págs: 71 e 72)

15 de abril de 2019

MEMÓRIAS E LIVROS

"A descoberta do alfabeto irá criar o esquecimento na alma dos que aprendem, porque eles não mais usarão a memória: irão confiar nos caracteres externamente escritos e não lembrarão por si mesmos... Será dado ao discípulo não a verdade, mas uma aparência da verdade; buscarão muitas coisas e não terão aprendido nada; parecerão oniscientes e geralmente nada saberão."

Sócrates (Fedro)


Sócrates era veementemente contra a palavra escrita. Sócrates pensava que livros fariam coisas terríveis à nossa memória. Guardaríamos o conhecimento em suas páginas, e não em nossa cabeça. E ele estava certo: as pessoas não carregam mais histórias como A Ilíada na memória, ainda que ela tenha sido transmitida em uma tradição verbal por centenas de anos antes da palavra escrita. Trocamos a memorização pela capacidade de aprender menos sobre mais - pela escolha. Não foi a palavra escrita que fez que a maioria de nós deixasse de memorizar o épico Odisseia, mas sim nossa escolha de não mais o memorizar e de ler livros em vez disso.

Clay A. Johnson (A Dieta Da Informação; págs: 40, 41 e 44)

11 de abril de 2019

SIGA EM FRENTE, A VIDA CONTINUA

A Morte Não é Nada

A morte não é nada.
Eu somente passei
para o outro lado do Caminho.
Eu sou eu, vocês são vocês,
O que eu era para vocês,
continuarei sendo.
Me dêem o nome
que vocês sempre me deram.
Falem comigo
como vocês sempre fizeram.
Vocês continuam vivendo
no mundo do Criador.
Não utilizem um tom solene ou triste,
Continuem a rir daquilo
que nos fazia rir juntos.
Rezem, sorriam, pensem em mim.
Rezem por mim.
Que meu nome seja pronunciado
como sempre foi,
Sem ênfase de nenhum tipo.
Sem nenhum traço de sombra
ou tristeza.
A vida significa
tudo o que ela sempre significou,
O fio não foi cortado.
Por que eu estarei fora de seus
pensamentos, agora que estou
apenas fora de suas vidas?
Eu não estou longe, apenas
estou do outro lado do Caminho...
Você que aí ficou, siga em frente,
a vida continua, linda e bela
como sempre foi.

Santo Agostinho