Infelizmente, ele não sabe se o guarda é desonesto e vai aceitar a propina ou se é honesto e vai prendê-lo por tentativa de suborno. Qualquer cenário desse tipo, em que o melhor curso de ação depende das escolhas de outro ator, faz parte do território da teoria dos jogos. Na teoria dos jogos, o problema em que um ator não sabe quais são os valores do outro já foi explorado por Thomas Schelling, que o chama de Problema de Identificação. (...) A atratividade de cada escolha é determinada pela soma da recompensa, (...) considerando o peso de suas probabilidades. (...) Se o motorista não tentar subornar o guarda, não faz diferença quão honesto é o guarda; de qualquer jeito, o motorista é multado. Quem não arrisca não petisca. Mas, se ele oferecer o suborno, há muito mais coisa em jogo. Se o Homem Máxima é sortudo e está diante de um guarda desonesto, o guarda vai aceitar o suborno e deixá-lo ir embora sem multa. Mas, se ele é azarado e está diante de um guarda honesto, será algemado e preso por suborno. A escolha racional entre subornar e não subornar vai depender da dimensão da multa, da proporção de bons e maus guardas nas estradas e das punições para o suborno, mas nenhuma das opções é atraente, O Homem Máxima se vê entre a cruz e a espada.
Mas pense agora em um outro motorista, o Homem Implicatura, que sabe como insinuar um suborno ambíguo, como em "Talvez o melhor seja resolver as coisas aqui mesmo". Imagine que ele sabe que o guarda entende a implicatura e a reconhece como sugestão de suborno, e também sabe que o policial sabe que ele não poderia acusá-lo judicialmente de suborno porque o palavreado ambíguo impediria a promotoria de comprovar sua culpa. (...) Também temos de levar em conta o ponto de vista de um guarda honesto e o sistema judicial a que ele serve. Por que um guarda honesto não prende quem faz uma oferta de suborno velada? (...) Para explicar porque o guarda não prende as pessoas que insinuam um suborno, o que tornaria a implicatura tão perigosa quanto um suborno descarado, temos de pressupor duas coisas, ambas razoáveis. Uma é que, se todos os motoristas desonestos dão declarações que podem (corretamente) ser interpretadas como subornos implícitos, há alguns motoristas honestos que dão declarações assim também, só que como observações inocentes. Assim, qualquer prisão pode ser uma prisão injusta, A segunda pressuposição é que uma prisão malsucedida é prejudicial, pois sujeita o guarda à acusação de prisão indevida e o departamento de polícia a punições.
Se a declaração parecer mais uma afirmação inócua que muitos motoristas poderiam fazer (ou, pelo menos, o bastante para que um júri fosse incapaz de condenar o falante por aquelas palavras), a chance de condenação cai, o risco de prisão aumenta. (...) E é aí que o Homem Implicatura consegue influenciar o guarda. Ele pode formular a declaração de modo que um guarda desonesto a detecte como insinuação de propina, mas que um guarda honesto não tenha como ter certeza (ou pelo menos não possa arriscar). (...) O Homem Implicatura está manipulando as opções do guarda honesto para se beneficiar, e para prejudicar o guarda.
Steven Pinker (Do que é Feito o Pensamento; págs: 446, 447 e 448)
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