A nossa estupidez e a nossa preguiça nos levam a acreditar que aquilo que sempre foi feito de um certo jeito deve ser o jeito certo de se fazer. Mas os gregos sabiam diferente: sabiam que o conhecimento só se inicia quando o familiar deixa de ser familiar; quando nos espantamos diante dele; quando ele se transforma num enigma. (...) A inteligência começa nas mãos. As crianças não se satisfazem com o ver: elas querem pegar, virar, manipular, desmontar, montar. Um amante se satisfaria com o ato de ver o corpo da amada? Por que, então, a inteligência iria se satisfazer com o ato de ver as coisas? A função dos olhos é mostrar, para as mãos, o caminho das coisas a serem mexidas. (...) As coisas não são assombrosas para todos. Só para aqueles que aprenderam a ver. A visão tem que ser aprendida. Os olhos precisam ser educados. (...) (Quem disser que o ensino se mede pelo número de horas-aula é um idiota). O que está em jogo é uma questão de valores, uma decisão sobre as prioridades que devem ordenar a vida universitária: se a primeira prioridade é desenvolver, nos jovens, a capacidade de pensar, ou se é produzir artigos para atender à exigência da comunidade científica internacional de publish or perish. Eu acho que o objetivo das escolas e universidades é contribuir para o bem-estar do povo. Por isso, sua tarefa mais importante é desenvolver, nos cidadãos, a capacidade de pensar. Porque é com o pensamento que se faz um povo. (...).
Os vestibulares, todos eles, se concentram no conhecimento das eventuais ferramentas do pensamento, e de tal maneira enchem o tempo e a cabeça dos adolescentes e jovens com tal conhecimento - pois é o único conhecimento que pode ser medido de forma quantitativa - que não sobra tempo para a educação da sensibilidade. Se os jovens não gostam de ler, se não desenvolvem a sua sensibilidade para as artes, se não ficam fascinados com a variedade da cultura humana, se são insensíveis à beleza da natureza, a culpa não é deles. Desde cedo os vestibulares lhes ensinaram que a única coisa importante são as ferramentas. (...) Nossas escolas são planejadas à semelhança das linhas de montagem: as crianças são "objetos" a serem "formados" segundo normas que lhes são exteriores. Ao final, formadas, são objetos portadores de saberes, centenas, milhares, todos iguais. Pertencem ao mundo do eu-isso.
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