3 de julho de 2014

HOMENS E MULHERES NO SEXO E NO TRABALHO

Na Atenas de Péricles, o separatismo elitista dos homens desembocava frequentemente em relações físicas homossexuais. Isto também acontece hoje, e os casos são crescentes. Porém, o homossexualismo a que estou me referindo nessa circunstância consiste em um posicionamento psicológico, em uma preferência, generalizada entre os executivos, de trabalhar só com homens. (...) Ainda hoje, tanto nos templos religiosos como nos leigos - bancos, conselhos diretivos, bolsas de valores -, a mulher pode colocar o pé somente como encarregada da faxina, como secretária, como funcionária de nível médio ou baixo. Deste modo, salva-se o espaço sagrado reservado aos homens e eles podem ocupá-lo da manhã à noite, até mesmo fazendo horas extras, ainda que não exista tal urgência e não recebam um salário extraordinário. O importante é voltar para casa o mais tarde possível, de modo a não se "rebaixar" fazendo coisas como ajudar no cuidado dos filhos ou nos trabalhos domésticos.

Na época de Sócrates, a esfera afetiva, a vida intelectual e a guerra ocupavam o centro da pólis e, portanto, nessas esferas, os homens exercitavam o monopólio. As mulheres, com exceção das cortesãs, eram analfabetas, segregadas em casa, condenadas às tarefas domésticas e ao convívio com as escravas. Um intelectual como Platão ou um político como Alcebíades, uma vez concluída as relações sexuais, não saberiam nem mesmo o que fazer ou do que falar diante de uma mulher. Por isso, preferiam relações amorosas com outros homens, com os quais, além da relação sexual em si, podiam sentir-se em sintonia cultural ou fortalecer alianças políticas. Muitos séculos depois, a revolução industrial deslocou o centro do sistema social para os negócios: fábricas, dinheiro, mercadorias, comércio. E os homens segregaram as mulheres fora desses centros, trancando-as nos recintos domésticos, dedicados aos afetos, à estética, à criação dos filhos. Coisas de qualquer forma desvalorizadas, não remuneradas, consideradas secundárias e quase pueris.

O que se atém ao rude, ao prático, ao econômico, ao competitivo e ao racional é reservado aos homens: guerras, trabalhos, esportes, hierarquias eclesiásticas, estados-maiores, conselhos administrativos e estádios. O que se refere à natureza, à beleza, à solidariedade, à emotividade é delegada às mulheres: criação, ensino, sedução, assistência, lar, jardim, escola, bordel, hospício e hospital. As mulheres, por sua vez, tornaram-se cúmplices dessa segregação homossexual. Nas palavras de uma estudiosa americana: "O machismo é como a hemofilia, quem padece da doença são os homens, mas quem a transmite são as mulheres." (...) Agora, pela primeira vez na História, a ciência permite que as mulheres tenham filhos sem ter um marido, enquanto, para os homens, por enquanto, não é tecnicamente viável ter um filho sem ter uma mulher. Até dez mil anos atrás acreditava-se que as crianças nascessem graças somente à virtude feminina, sem qualquer intervenção geradora do homem. Hoje, biogeneticamente, aquela crença se tornou realidade, estabelecendo as bases fisiológicas para um novo matriarcado.
 
A segunda circunstâncias é que hoje, como já dissemos, a sociedade pós-industrial delega as tarefas cansativas e repetitivas às máquinas, deixando aos humanos as atividades flexíveis, intuitivas e estéticas. Atividade para as quais, historicamente, as mulheres encontram-se mais bem preparadas, pelo simples fato de que os indivíduos do sexo masculino foram sempre tradicionalmente educados para agir de forma racional, rígida e programada. Onde se afirmam atividades que requerem flexibilidade, intuição, emotividade e senso estético - na ciência, na arte, no cinema,  na moda e na mídia -, aportam, pontualmente, as mulheres e debandam os homens. E é um processo tão acelerado, que legitima a triste hipótese de uma próxima fase de homossexualidade hegemônica: a das mulheres que se relacionam só com mulheres, porque com os homens têm bem pouco o que dizer e bem pouco a compartilhar.

Uma futura sociedade dominada pelas mulheres com exclusão dos homens seria tão injusta quanto a sociedade passada, dominada pelos homens, com exclusão das mulheres. Em ambos os casos, o que se perde é a riqueza da pluralidade. Por sorte, ainda temos tempo para evitar esse segundo erro, porque os homens estão perdendo a hegemonia, mas as mulheres ainda não a conquistaram. Os homens estão começando a adotar muitas das características femininas: cuidar do corpo, por exemplo, demonstrar maior ternura, usar alegremente cores vistosas no modo de vestir, cuidar mais da casa, ou perder a vergonha de chorar no cinema, diante de uma cena comovente. As mulheres, por sua vez, começam a adquirir desenvoltura na vida pública, consciência de que têm o direito ao acesso às poltronas do poder e à justa pretensão de que também os homens participem no cuidado dos filhos.

Domenico de Masi (O Ócio Criativo; págs: 159, 160, 161 e 162)

Nenhum comentário: