7 de fevereiro de 2021

TRINTEI


Foto (Tim Oliveira)

 

É isso. #Trintei à uns dias atrás (22/01). E pensando em que pé me encontro à essa altura, vejo e revejo, entre as merecidas elucubrações, sob que arcabouço tenho calcado meus pés nessa caminhada que tem se mostrado em constante reformulação. Tento organizar aqui um pouco do que tenho percebido sobre o ato de planejar; o que é o destino e, perpassando por tudo isso, a difícil arte de lidar com o tempo. Don Corleone dizia que "todo homem tem apenas um destino", soa fatalista - ideia que me falta certa simpatia - mas parece haver algum sentido, vejamos: se a ideia é que não podemos ser tudo o que gostaríamos, ok.. Não dá pra ter todos os destinos, significa que uma série de caminhos, a rigor, se apagam das possibilidades, porque as escolhas necessariamente excluem outras. Esse jogo ganha importância, provavelmente, na medida em que nos conhecemos e descobrimos com isso o que podemos/queremos - ou não - ser. Mas no final de tudo, do presente para trás as pessoas carregam uma história e, ou, do passado para frente tiveram um destino. Em ambos os casos só é possível o contemplar depois de concretizado, ou seja, tarde demais para alterações, restarão, no melhor das hipóteses, apenas saudosismos. Embora saudades indiquem a memória de boas experiências, aqui me junto aos estoicos que dizem só valer a pena gastar energia no que se pode, ao menos, influir ou intervir, e que nos cabe, antes de mais nada, discernir o que podemos - ou não - controlar. Portanto, para todos os efeitos, o destino, no que importa agora, é feito em tempo real e em direção a um tempo que - quanto mais distante do agora - mais incerto é em relação ao futuro. E se tem uma coisa que assusta o homo sapiens, desde que o mundo é mundo, é ter que lidar com o que não se tem certeza. Nessas horas a criatividade para especular é interessante. A histeria diante de objetos estranhos formam esse caldo: raios já foram frutos da irá de Zeus, doenças a punição de outras forças, e a terra até já foi plana - ainda é para alguns.. - mas aí já é outra história. O que se revela no fundo mesmo é o desejo e a busca constante de compreender o que há no entorno e, por outro lado, o incômodo quando não se sabe. Enfim, uma aversão a imagem de se ver realmente ignorante. O vazio é um silêncio difícil de engolir. E aqui o planejamento parece ser um artifício que, não raras vezes, revela mais a incapacidade de controlar o futuro do que uma "organização eficaz da agonia" (L.F. Pondé). Ou é justamente isso.

Há uma dimensão especulativa no ato de planejar. Em alguma medida, planejar é apenas uma projeção pessoal na qual suas faculdades intelectuais acreditam estar em poder de prever os próximos acontecimentos. O esforço em montar hoje as expectativas sobre o porvir, parece, em muita das vezes, nos desviar, justamente, daquele limiar de tempo - impossível de ser no passado ou no futuro -, que nos cabe, efetivamente, fazer o que tem que ser feito: o presente. E quanto a vida, dela não podemos fazer nada no passado; porque já se foi e nem no futuro; porque não existe. Simples assim. No entanto - diferente do passado - o futuro é aberto e não resta outro espaço-tempo onde construí-lo que não no presente, seja lá o que isso signifique, uma vez que o tempo não para. Se o futuro a cada instante se torna passado, o que é o presente? Não sei exatamente.. Mas - de improviso - a  melhor definição que encontrei até agora é que o presente é uma espécie de estado de espírito, e os sinais apontam que a vida se dá nesse tal presente, esse lugar parece ser o centro do destino de cada um. É algo nebuloso, talvez, por isso mesmo, seja um dos segredos mais escondidos, embora gritantemente visível à todos o tempo todo. Tudo que nos desvie desse estado de espírito nos joga naquele limbo temporal - morada das fantasias e ilusões - na qual, na interseção desses mundos, se faz presente aquela faca de dois gumes, sempre disposta a cortar a tênue linha que separa a alienação da consciência, e vice-versa. Enfim, não faltam artifícios para negligenciar o presente. O grande conto do vigário de ver propósito em tudo presta papel semelhante - dependendo da narrativa que se acredita - que, não raras vezes, acaba por desvirtuar o presente, uma vez que propósito e fatalismo facilmente flertam um com o outro quando acredita-se que por trás de todos os acontecimentos do mundo há uma razão maior operando a favor de um determinado destino - o que por si destrói a essência do que é ser/estar presente. E sem possibilidade de potência no agora, mais difícil ainda será um planejamento dar conta de nos fazer ir adiante.

Planeja não é inútil, longe disso, é necessário, há espaço para planejar muita coisa, desde que não se mire muito longe no tempo, ou que você não seja muito burro sobre o que decide criar expectativas.. Afinal, a vida não é feita de reviravoltas a cada semana, é só uma questão de grau, uma vez que também não é razoável viver como se fosse o último dia. O ponto é que qualquer futuro que se busque, o que se faz exatamente agora tem um peso muito maior nas coisas que interessam do que até mesmo o plano mais detalhado. Um plano raramente é executado à risca, não só, as vezes, por falta de disciplina, mas pelas circunstâncias, o qual um conjunto de variáveis imprimem uma volatilidade incompatível com planos rígidos. Uma flexibilidade de fundo sempre faz com que as coisas avancem sobre as demandas que surgem. Como George Patton, um famoso comandante da Segunda Guerra Mundial, disse: "Um plano razoável executado hoje é melhor do que um plano perfeito executado amanhã". Enquanto isso.. - tic-tac - o tempo é escasso! Sempre foi, e como algo que está prestes a acabar, sua finitude se torna um convite a repensar o caminho - mais do que a chegada - o qual já está resolvida, selada entre você e sua própria condição e é, segundo à lenda - pasmem.. - que você irá morrer.. Eu sei.. Uma ideia indigesta e impopular, mas que as religiões estão aí pra dar uma força. Enquanto não se sabe exatamente o que implica morrer, seja lá o que isso for.. Até lá, "deixemos de coisa e cuidemos da vida".

"Brevíssima e demasiado angustiosa é a vida daqueles que se esquecem do passado, negligenciam o presente e temem o futuro." (Sêneca)

Demorei muito pra entender, e aceitar que por conta de tudo que nos forma e nos torna único, acabamos por seguir - não só - caminhos diferentes mas, também, tempos diferentes. Evolui-se num ponto, estagna-se em outro, retomamos uns, abandonamos outros. A consciência de todas essas idas e vindas, entre glórias e fracassos, me impele à uma versão minha num ponto em que a inércia perde seu poder de atração, e um jeito próprio se impõe como um traço genético que vem à tona, com mutações, mas pra melhor. O caráter contingencial do desenrolar das coisas parece, de tempos em tempos, nos colocar diante de um espelho em que não resta outra coisa que não se encarar. No reflexo vejo também que a origem de alguém é o conjunto daquelas variáveis - ou condicionantes - que não se escolheu: seus pais, sua geografia, sua época etc, mas que, no entanto, te formam. Isso parece apontar de onde se veem. E não é possível fugir da influência de tudo isso quando o objetivo é se conhecer, e se encontrar em meio a tantos universos possíveis. Como vou lidar, ou resolver algo que não consigo, minimamente, definir? Parece necessário uma assimilação e compreensão do seu próprio início e, então, reintegrar-se. Jamais negar sua história, mas, sim, incorporá-la visceralmente, e construí-la melhor daí pra frente, de dentro pra fora, com as rédeas que cabem nas próprias mãos e ir adiante rumo ao fim.

Falar em fim.. Chega desse ensaio de inspiração autobiográfica.. Já que ainda tenho - hipoteticamente - mais tempo pela frente pra viver do que já vivi até agora - o que é um belo consolo. E é de bom tom dizer o que permanece e sobrepõe à toda possível dimensão trágica que porventura o caminhar possa trazer à tona. Gostaria de expressar que, genuinamente, carrego um sentimento de gratidão por várias coisas (sem arriscar citar nomes sob pena de ser injusto.. Vou contar com a tese [que inventei agora] de que as pessoas sentem na alma o papel que decidem ter na vida alheia..). Sou grato pelas pessoas que tive a sorte de encontrar por aí, sobretudo, pelas que sei ainda estarem próximas; pelas equipes que tive a honra de fazer parte e à todas as emoções que apenas bons grupos vivem; pelos ídolos que pude conhecer pessoalmente e atemporalmente e a inspiração espelhada que deles emanam; à todo ato de generosidade que recebi; pelas músicas que posso apreciar e companhias desfrutar. E ao meu grande amor que - e mais importante - é feliz em existir e, quando necessário, se reinventar. Com você até as coisas mais triviais brilham à luz da eternidade.

Diego Cosmo

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