Há uma piada entre a turma da comunicação que faz insinuações em relação a publicitários e jornalistas. A piada - se é que poderíamos assim chamar - conta que publicitários, diante do único mal irremediável, sabem que vão para o inferno [lembra-te do teu "deus"] e que jornalistas não sabem, que também vão.. [não esqueça-te do teu "deus"] O que acho interessante nessa insinuação é que há, por trás, uma verdade que mostra um pouco da postura desses profissionais diante da realidade, ou com o que consideram fatos. Vale ressaltar se tratar aqui de uma visão caricata das profissões. Tá? Envolve estigmas ou estereótipos, talvez pejorativos, que o próprio desempenhar da função parece expressar subjetivamente. Isso, em alguns casos, claro. Não deixemos de honrar as digníssimas exceções que certamente irão para o céu, sem perder tempo no purgatório. Quem atua na área há de reconhecer alguns dos traços comentados logo abaixo. Amém.. Mas vamos ao que interessa, ao qual nada tem a ver com religião, mas com cosmovisão.
Publicitários, pela própria natureza do ofício, conservam um certo caráter sofista e com isso uma potencial relativização dos fatos. Não lidamos, somente, com a verdade concreta, mas, antes de mais nada, jogamos e interagimos com a realidade percebida, afinal, a verdade - para todos os efeitos - é tudo aquilo que acreditamos ser verdade. Assim, entramos na onda e nos relacionamos criativamente com os fatos, desejos e aspirações por trás do que se entende sobre a realidade. A grosso modo, como os sofistas, para os publicitários, a realidade, até certo ponto, é relativa. Ou seja, um prato cheio para se construir mundos através das tais narrativas se valendo de toda cor, tom, formas, sons, representações, simbologias, etc. As aulas de semiótica, psicologia do consumidor e, sobretudo, neuromarketing já dão conta de ensinar, aos aspirantes ao fantástico mundo da publicidade, que a forma que o indivíduo percebe e se relaciona com a realidade tem mais a ver com toda sorte de viés de confirmação ou distorção cognitiva, do que de fatos. Nesse terreno nos valemos de todo aparato que possa ter uso para fins de comunicação, no intuito de atrair, persuadir, convencer, influenciar, etc. Não é raro criar-se um certo cinismo ou ceticismo quando a discussão é sobre a realidade, porque isso, a princípio, vai variar de acordo com o target. Ok?
Já os jornalistas têm, devido a própria natureza do ofício, pretensões de encontrar verdades absolutas. (o que me faz crer que quem criou a piada deve ter sido algum publicitário..). Busca-se as melhores fontes de informações; investiga-se, muitas das vezes, com a melhor das intenções; busca-se anunciar ao mundo sobre uma verdade que é verdadeira mesmo. Bom.. O resultado é que devido a uma certa falta de ceticismo diante dos inputs que nos permitem ir montando o quadro da realidade, jornalistas baixam a guarda para os potenciais vieses que todos nós carregamentos em si, em um grau ou outro, ao qual se impõem no julgamento na ausência de um policiamento frio da racionalidade. Por isso, cria-se, uma certa ilusão de se estar mais perto dos fatos, ou da realidade, que os demais mortais. É precisamente tal ilusão que os fazem crer que "não irão para o inferno", sobretudo, tão certos de serem bem intencionados em sua nobre missão de fazer com que todos saibam a verdade verdadeira. Não é raro uma certa arrogância, quanto ao entendimento dos fatos, quando você se julga em posse das melhores informações. Certo?
Por fim, não há como negar que boa parte do que vemos na mídia - um mundo arquitetado por comunicólogos - carregam doses de cinismo e arrogância por trás de suas articulações, e quanto à isso, gregos e troianos - em nome da tragédia - concordam. Seja lá no que seja, haverá sempre os melhores profissionais tanto no lado A, quanto no B, e, claro, julgando-se - cada um - sempre estarem no lado certo da história, no entanto, uns mais convictos do que outros, seja por cinismo ou por arrogância. Mas "brincadeiras" à parte.. Permitam-me, como publicitário, anunciar que, segundo a lenda, não existe inferno, ou céu. E nem Papai Noel...
Diego Cosmo
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