Se um médico humano fizer um diagnóstico errado, ele não vai matar todos os pacientes do mundo e não vai bloquear o desenvolvimento de todos os novos medicamentos. Em contraste, se todos os médicos são na verdade um único sistema, e se esse sistema comete um erro, os resultados podem ser catastróficos. No entanto, um sistema integrado de computadores pode maximizar as vantagens da conectividade sem perder os benefícios da individualidade. Podem-se rodar muitos algoritmos alternativos na mesma rede, de modo que um paciente numa aldeia remota na selva seja capaz de acessar com seu smartphone não apenas um único médico capacitado, mas cem médicos de IA diferentes, cujos desempenhos relativos são comparados o tempo inteiro. Você não gostou do que o médico da IBM lhe disse? Não tem problema. Mesmo que esteja enfurnado em algum lugar das encostas do Kilimanjaro, você pode contatar facilmente o médico da Baidu para ter uma segunda opinião. Os benefícios para a sociedade humana provavelmente serão imensos. A IA em medicina poderia prover serviços de saúde muito melhores e mais baratos a bilhões de pessoas, especialmente para as que hoje não têm acesso algum a esses serviços. Graças a algoritmos de aprendizagem e sensores biométricos, um aldeão pobre num país subdesenvolvido poderia usufruir de uma assistência médica muito melhor usando seu smartphone do que a pessoa mais rica do mundo obtém hoje em dia no mais avançado dos hospitais urbanos. Da mesma forma, veículos autodirigidos poderiam fornecer às pessoas serviços de transportes muito melhores e reduzir a taxa de mortalidade por acidentes de trânsito. Hoje, cerca de 1,25 milhão de pessoas morrem todo ano em acidentes de trânsito (o dobro das mortes causadas por guerra, crime e terrorismo somadas). Mais de 90% desses acidentes são causados por erros humano: alguém que bebeu e dirigiu, alguém digitando uma mensagem enquanto dirige, alguém que adormeceu ao volante, alguém sonhando acordado em vez de prestar atenção à estrada. A administração Nacional de Segurança de Trânsito em Estradas dos Estados Unidos estimou que, em 2012, 31% dos acidentes fatais no país envolveram uso abusivo de álcool, 30% envolveram excesso de velocidade e 21% envolveram desatenção do motorista. Veículos autodirigidos nunca farão nada disso. Embora tenham seus próprios problemas e limitações, e embora alguns acidentes sejam inevitáveis, espera-se que a substituição de motoristas humanos por computadores reduza mortes e ferimentos na estrada em cerca de 90%. Em outras palavras, a mudança para veículos autônomos pode poupar a vida de 1 milhão de pessoas por ano. Por isso seria loucura bloquear a automação em campos como o do transporte e o da saúde só para proteger empregos humanos. Afinal, o que deveríamos proteger são os humanos - não os empregos. Motoristas e médicos obsoletos simplesmente terão de achar outra coisa para fazer.
Yuval Noah Harari (21 Lições para o Século 21; págs: 45 e 46)
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