O feminismo cometeu o erro de acreditar que esse é o futuro, que é isso que buscamos, que buscamos uma redução da masculinidade, para que as mulheres façam essa transição do ambiente de trabalho para casa de forma mais tranquila, mas não estou certa se o total de felicidade humana cresceu devido a essas mudanças. O que estou dizendo é que por milhares de anos existiram o mundo das mulheres e o mundo dos homens, e as mulheres controlavam tudo o que tinha relação com o nascimento, gravidez, elas eram encarregadas da criação dos filhos, de cuidar dos idosos, da cozinha, da casa. Essa divisão natural de trabalho vinha acontecendo desde o período de caça, os homens saíam e faziam as coisas perigosas, caçavam. E as mulheres tinham uma felicidade e uma solidariedade que foi perdida, certo? Isso é o que estou tentando chamar a atenção das mulheres profissionais, o fato de que a sensação de infelicidade neste novo mecanismo do ambiente de trabalho burguês não se deve inteiramente ao sexismo masculino, é devido ao caráter desumanizador do sistema de carreira moderno, que também vitimiza os homens.
[Acho que existe muita base biológica para o comportamento dos sexos que o feminismo atual não reconhece]. Existem certos fatos fundamentais que a atual teoria de gêneros se recusa a reconhecer, que a maioria dos homens tem de 8 a 10 vezes mais o nível de testosterona, o hormônio masculino, que qualquer mulher. Existem diferenças profundas no cérebro que surgem de banhar os tecidos nesse hormônio masculino. Não vejo a testosterona como o inimigo da humanidade como tantas feministas veem. Acho que essa energia ativa e agressiva dos homens criou civilizações. A mulher moderna se beneficiou tremendamente desses grande sistemas que o homem criou. E nesses sistemas protetores nós tomamos o poder, temos uma voz, temos proeminência etc. O homem segue fazendo no mundo todo o trabalho sujo e sem glamour com as mãos. Algo que vi há duas semanas, uma grande rede de esgoto se rompeu numa cidade vizinha e as pessoas que estavam lá fazendo o trabalho sujo eram todos homens.
O feminismo, num período dos anos 1990, era dominado pelo feminismo antipornografia. O argumento delas era que a representação de mulheres nuas causa estupros. Vejo essas mulheres como puritanas fanáticas. Para mim, a pornografia é uma forma de arte, é um artifício, é algo criado, é um mundo de fantasia, de imaginação. E há espaço para dizermos: "Isso é pornografia de boa qualidade e essa é de má qualidade". Mas acredito que a pornografia seja necessária nesta era moderna. Esse mundo higienizado de escritórios onde nada é permitido, quase nenhuma individualidade é permitida. A imaginação sexual é freada, negada, aprisionada e o que a pessoa busca e acha na pornografia. Então, o que ofende tantas mulheres burguesas quando veem pornografia? Elas dizem: "Isso é tão degradante, isso é degradante para as mulheres". Talvez você veja como degradante, mas não pode ver que o código da respeitabilidade burguesa, de sutileza, de limpeza, de propriedade, todas as regras são questionadas e quebradas pela pornografia. Quando vemos essa regra vandalizada, profanada... Qualquer coisa sagrada eventualmente será profanada. No momento em que estabelece algo puro, então, há a necessidade de ter a resposta dinâmica do impuro. Isso é o que acontece na pornografia.
Me rebelei contra a vigilância da administração da faculdade sobre as vidas das alunas. Foi o período do chamado "in loco parentis", ou seja, no lugar dos pais. As administrações das faculdades achavam que tinham a obrigação de supervisionar, de monitorar, proteger as alunas, como não faziam com os alunos, então, tínhamos dormitórios femininos e masculinos. Os homens podiam entrar e sair a qualquer hora da noite, as mulheres tinham de se retirar às 23 horas. Pedimos um fim desta prática. E eles disseram: "O mundo é perigoso, temos a obrigação de protegê-las de estupros". E o que dissemos foi: "Nos deem a liberdade de arriscar", isso é a verdadeira liberdade. Isso foi o que a revolução sexual deu às mulheres: liberdade. Agora o que as mulheres fariam com a liberdade? O feminismo deveria ter escolhido minha visão e dizer: "Agora, você é igual ao homem e deve se proteger como um homem faria. Você deve ver o mundo como perigoso, como um homem faria. Você deve ficar na defensiva e ser ultraconsciente do que está ao seu redor, como um homem faria", pois os homens também são atacados por inúmeras coisas. Homens também são vítimas de crimes. Ao invés disso, temos um processo de mulheres pedindo proteção, um novo paternalismo do governo e, agora, das administrações das faculdades. Querem trazer de volta as figuras paternas em suas vidas sexuais. Isso, para mim, é uma grande falha do feminismo atual. Existem muitas responsabilidades quem vêm com a liberdade e uma delas é você se responsabilizar por sua defesa.
A comunicação e a comunicação sexual, é muito mais que palavras. A comunicação sexual é feita pelo corpo, há uma série de modos não verbais nos quais comunicamos nosso interesse em sexo ou nossa aptidão para o sexo. E um deles é a vestimenta. Me parece que a mulher contemporânea não pensou totalmente na natureza de seu modo de vestir. Digo para as mulheres: "Exponham seus corpos, faça o que quiser, mas estejam preparadas para se proteger, tenham cuidado com os perigos do mundo". Não só o homem de sua própria classe social mas também o mundo das feras primitivas que ainda estão circulando. A natureza humana tem todo tipo de energia primitiva que é suprimida e treinada por meio da força civilizadora, mas muita gente é psicótica, existem muitos psicóticos... Você pode ter 999 homens racionais e haverá um psicótico. Uma mulher deve estar preparada para se proteger do psicótico, porque esse um psicótico pode matá-la, não só estuprá-la, mas matá-la. São monstros que estão soltos, são manifestações vivas de energia diabólicas e primitivas ainda latentes nos seres humanos. É o que o cinema nos mostra. O que argumento é que o feminismo, me parece, tornou-se quase estúpido ao negar que a vestimenta sexual passa uma mensagem sexual.
O que não gosto do feminismo atual é que toda a sua energia é direcionada para proteger a garota burguesa, a garota branca de alta classe que quer que o mundo seja como sua sala de estar. Ela é protegida por seus pais, protegida pela faculdade e quer partir para o mundo vestida exatamente como quer, ela nem se quer imagina os perigos do mundo, não ensinaram a ela os perigos do mundo e ela espera que o mundo seja reduzido a essas proteções burguesas. Ela não percebe o seu privilégio, ela é arrogante e passou sua arrogância para o feminismo.
Antes de tudo, o problema da violência doméstica, a síndrome da mulher agredida, acho que devemos fazer uma distinção. Existem casos na classe operária, em todo mundo, em que a mulher não tem recursos financeiros para partir, então, ela está presa a uma situação em que é explorada e abusada. Mas temos de criar uma categoria separada de mulheres de classe média que têm a capacidade de partir e que, na verdade, é atraída ao homem que abusa dela. Acredito que os sinais do abuso e do controle desse homem já estavam presentes quando eles namoravam e a mulher ignorou os sinais. Mais do que isso, há uma simbiose nesses relacionamentos em que o homem é infantil. Bater na mulher é uma tentativa patética de controlar um ser que é mais forte do que ele. Acho que é um eco da mãe. Tais homens provavelmente sentiram-se sufocados pela mãe. O que vi em minhas observações pessoais de tais relações é que a mulher quase se automartiriza, sentem que apenas elas podem curá-los. Ele precisa de ajuda, ele é outra criança, e você vê cenas de ira e de destruição. Então, ele chora e implora por perdão e diz que é a última vez. Há algo muito estranho e, na verdade, mutuamente sadomasoquista nesses relacionamentos de classe média. Novamente, a análise feminista tem de permitir os paradoxos e ambiguidades da psique humana. A síndrome da esposa agredida pode ser mais complexa do que parece na superfície.
Acho que o feminismo tornou-se muito isolado, ele conversa só com ele mesmo. Não houve uma busca pelas mulheres convencionais. O feminismo prejudicou sua própria reputação por seu clubismo e provincianismo. Para mim o feminismo é inútil se as feministas conversam com elas mesmas e se recusam a aceitar críticas, mesmo de dentro do feminismo. A recusa das feministas em ler o trabalho de opositores de sua visão, a confiança passiva e preguiçosa em boatos e fofocas. Elas se comportam como se fossem pensadoras religiosas ao invés de ativistas sociais. Gostaria que o feminismo agora se concentrasse nas atrocidades reais do mundo, onde quer que existam. A terrível vulnerabilidade das mulheres rurais na Índia me parece muito mais carente de atenção do que os problemas das mulheres profissionais de classe média que devem ser retiradas dessa centralização obsessiva que ela conta atualmente. E há muita confiança em, para mim sempre fracas, teorias de feministas acadêmicas. Estudos sobre mulheres e estudos sobre gênero foram criados sem nenhuma referência ao estudo da biologia, ou história em geral. Deveria haver cursos obrigatórios de biologia, antropologia e história mundial. E essa repetição interminável de teorias, teorias que não fazem o menor sentido sobre como pessoas de verdade levam suas vidas reais no mundo real. Isso tem de parar.
Camille Paglia (Roda Vida)
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