Andy Hug
INTRODUÇÃO
A competição é a oportunidade onde o atleta demonstra suas habilidades e competências, desafiando seu desempenho, seja numa perspectiva pessoal ou na tentativa de quebrar um recorde (DE ROSE JUNIOR, 2002). O desempenho esportivo de excelência caracteriza-se pela combinação de um conjunto de fatores, dentre os quais se destacam a condição física, o nível técnico e o aspecto psicológico (MARAVIESKI, CALEGARI e GORLA, 2007). Porém, em diversas modalidades, se observa que os aspectos físicos, técnicos e táticos estão cada vez mais semelhantes entre os competidores, sugerindo que o estudo das variáveis psicológicas torne-se um diferencial na busca pelo resultado (FERREIRA, 2008).
Deschamps e De Rose Junior (2006) afirmam que a preparação psicológica influencia em uma série de modificações nos processos e estados psíquicos do atleta. De acordo com Quadros, Vicentim e Crespilho (2006) a autoconfiança é uma das variáveis a ser desenvolvida pelos atletas a fim de lidar com determinadas situações inerentes ao contexto esportivo competitivo.
A autoconfiança pode ser entendida como a crença do indivíduo quanto à sua própria capacidade de realizar com sucesso um comportamento desejado (WEINBERG e GOULD, 2001). Quando desenvolvida em níveis ideais pelo atleta, a autoconfiança auxilia no desempenho esportivo, intensificando as emoções positivas, aumentando a concentração, estabelecendo metas mais desafiadoras, aumentando o esforço e desenvolvendo estratégias competitivas efetivas (MACHADO, 2006). No entanto, quando muito elevada, a autoconfiança pode ser prejudicial ao desempenho esportivo, nos casos em que o atleta apenas acredita no seu potencial psicológico para realizar uma tarefa proposta e não possui atributos necessários como a condição física, nível técnico e tático (O´BRIEN et al., 2005).
Este estudo objetivou revisar a literatura acerca das relações entre a autoconfiança e o desempenho esportivo. Foram revisadas as bases de dados eletrônicas Scientific Eletronic Library On-line (SciELO), Pubmed Central (PMC) e Science Direct, selecionando estudos publicados no período entre 2000 e 2008. As buscas ocorreram através da seleção de palavras-chave como: autoconfiança, desempenho esportivo, atletas, esporte; e seus correspondentes em inglês: self-confidence, sport performance, athletes, sport.
DESEMPENHO ESPORTIVO
O desempenho esportivo é a denominação dada à unidade de execução e resultado de uma seqüência complexa de ações esportivas (BÖHME, 2003). Para competir, o atleta deve estar preparado física, técnica, tática e psicologicamente para se destacar entre aqueles que praticam determinada modalidade esportiva, o que requer um trabalho planejado visando o aperfeiçoamento dos requisitos necessários para se obter os melhores resultados (DE ROSE JUNIOR, DESCHAMPS e KORSAKAS, 2001; DE ROSE JUNIOR, 2002; MARAVIESKI, CALEGARI e GORLA, 2007).
Nos modelos de desempenho esportivo, propostos na literatura, a aptidão física junto com a condição física, a técnica e a tática esportiva são consideradas condições pessoais diretas ao desempenho esportivo (BOHME, 2003). O modelo exposto por Kiss et al. (2004) propõe que o desempenho é uma conseqüência de vários processos internos sofridos pelo atleta, não apenas de elaboração e de decisão do movimento, mas de regulações autonômicas tais como da freqüência cardíaca, freqüência respiratória, substratos energéticos, temperatura, equilíbrio hidroeletrolítico e hormonal. Todos esses processos estão adaptados às interferências de fatores ambientais, com especial ênfase ao treinamento físico (PEDRINELLI, 2006), sendo também influenciados pelas emoções. As emoções promovem mudanças profundas em todo o corpo reguladas pelo sistema nervoso central, pelo sistema autônomo (simpático e parassimpático), e pelas glândulas endócrinas (MACHADO e CALABRESI, 2003).
Os pensamentos, sentimentos e atitudes dos atletas sobre si mesmos e o ambiente esportivo, evidenciam a forma de comportamento e influenciam o desempenho esportivo destes durante a competição (DESCHAMPS e DE ROSE JUNIOR, 2006). As características e competências psicológicas, como partes integrantes do desempenho esportivo, são capazes de diferenciar os atletas bem sucedidos e com bons rendimentos daqueles que apresentam piores “performances” competitivas, sendo alvo de estudo dos pesquisadores que tentam compreender as situações presentes no ambiente esportivo (CRUZ e GOMES, 2001).
Nesse sentido, o equilíbrio emocional é um aspecto integrante do esporte competitivo. Considera-se que no esporte de rendimento, muitos estímulos podem causar efeitos emocionais positivos e/ou negativos, e tais efeitos influenciam diretamente no desempenho do atleta, na sua forma de atuar e na sua disposição diante da competição, do adversário e das vitórias ou derrotas (VIEIRA et al., 2008). De maneira geral, atletas que possuem um maior controle emocional tem a possibilidade de alcançar resultados mais favoráveis na hora da competição (PRAPAVESSIS e GROVE, 1991; DETÂNICO e SANTOS, 2005; REBUSTINI et al., 2005; RAPOSO, LÁZARO e COELHO, 2006). Dentre os fatores psicológicos, a autoconfiança ocupa lugar de destaque para o controle e manutenção de variáveis tais como o estresse e a ansiedade, presentes no contexto esportivo (BEATTIE, 2004; LIZUKA et al., 2005).
AUTOCONFIANÇA
A autoconfiança é uma crença pessoal de que se pode realizar, com sucesso, uma determinada tarefa (WEINBERG e GOULD, 2001). Para o esporte, são considerados dois tipos de autoconfiança, a traço e a estado (VEALEY, 1986). A autoconfiança traço refere-se à crença ou grau de certeza que os indivíduos geralmente possuem em relação à capacidade de serem bem-sucedidos no esporte (está relacionada à personalidade do indivíduo), por outro lado o estado de autoconfiança é a crença ou certeza que os indivíduos têm em um determinado momento em relação à capacidade de serem bem-sucedidos no esporte. Tendo em vista essas duas definições, pode-se dizer que a autoconfiança é uma expectativa, um pensamento subjetivo do indivíduo acerca da realização de tarefas de modo geral ou específico.
A autoconfiança poderá auxiliar o atleta a reduzir e controlar possíveis situações que surgirão no decorrer da competição tais como o estresse e a ansiedade (EDWARDS et al., 2002). Atletas que apresentam baixos níveis de autoconfiança tendem a encaram a ansiedade como debilitadora da performance ficando sensíveis a qualquer percepção de ameaça quanto ao desempenho desejado em uma competição esportiva (EUBANK e COLLINS, 2000).
Ao que tudo indica, a autoconfiança é uma variável que tem auxiliado os atletas a controlar elevados níveis de ansiedade aumentando assim suas expectativas de alcançar o desempenho estabelecido (EDWARDS et al, 2002; BEATTIE, 2004, LIZUKA et al., 2005, DESCHAMPS e DE ROSE JUNIOR, 2006).
Covassin e Pero (2004), verificaram que atletas com indicativos de elevada autoconfiança mantiveram um baixo nível de ansiedade pré-competitiva, e que isso os fez permanecerem calmos e relaxados durante a competição. Também Kais e Raudsepp (2005), constataram que níveis mais elevados de ansiedade estão geralmente associados com as percepções negativas quanto ao desempenho esportivo desejado para a competição. Em um estudo realizado no Reino Unido com 10 ginastas de elite, se investigou a relação existente entre a ansiedade e a autoconfiança. Os resultados apontaram que a autoconfiança é uma das qualidades mais poderosas dos atletas para o controle da ansiedade, pois permite ao atleta manter uma expectativa positiva quanto ao seu desempenho durante a competição (HANTON, MELLALIEU e HALL, 2004).
O estudo de Stoeber et al., (2007) investigou a relação entre o esforço do atleta e as reações negativas quanto ao mau desempenho na competição e verificou que o esforço que o atleta manteve durante a competição esteve associado a um nível de ansiedade mais baixo e uma autoconfiança mais elevada. Com base neste resultado, se pode dizer que os atletas que se esforçam para obterem o desempenho desejado, geralmente possuem um baixo nível de ansiedade e alto nível de autoconfiança.
Assim, é necessário que haja um desenvolvimento harmônico entre os fatores que compõe o desempenho esportivo, pois se o atleta apenas acreditar no seu potencial para a execução da tarefa e não possuir as habilidades e competências necessárias para tal feito, o mesmo não terá um desempenho satisfatório na competição (LIZUKA et. al, 2005).
Dentre os métodos para se desenvolver a autoconfiança estão: realizações de desempenho, pensamento confiante, mentalizações, condicionamento físico e a persuasão verbal (O´BRIEN et al., 2005). A técnica psicológica da simulação cognitiva, na qual os indivíduos se visualizam executando de maneira bem sucedida alguma tarefa que exija habilidade, melhora seu desempenho posterior (COSTA, 2003). Ou seja, se a pessoa tem uma avaliação negativa de seu desempenho, antecipa fracasso e se tem uma positiva, antecipa sucesso.
AUTOCONFIANÇA E DESEMPENHO ESPORTIVO
Alguns estudos destacam que geralmente quando a técnica, a tática e a preparação física são visivelmente iguais entre os competidores, o que irá prevalecer e diferenciá-los durante a competição é justamente o nível de autoconfiança apresentado (MAMASSIS e DOGANIS; 2004; HANTON e CONNAUGHTON, 2002; PSYCHOUNTAKI, e ZERVAS, 2000).
Os níveis de performance esportiva dos atletas também são relacionados a autoconfiança nos estudos. Williams e Reilly (2000), avaliando talentos no futebol, concluíram que os jogadores considerados mais talentosos possuíam uma maior autoconfiança e uma menor propensão a distúrbios da ansiedade.
No que diz respeito a técnicos e treinadores, o estudo de Simões et al. (2006) verificou que através do desenvolvimento da autoconfiança dos atletas avaliados, os comportamentos e indicativos de amizade, confiança mútua e respeito se fortaleceram na relação técnico-atleta. Através do emprego das técnicas de desenvolvimento da autoconfiança, o técnico tem a oportunidade de conhecer melhor seu atleta possibilitando assim uma relação de respeito, confiança e amizade entre ambos. Sendo assim, presume-se que as técnicas de desenvolvimento da autoconfiança devam ser empregadas nos treinamentos desportivos já que, de acordo com Tubino e Moreira (2003), os treinadores são os responsáveis diretos pelo ajustamento individual dos atletas e pelo ajustamento do grupo.
A literatura é divergente quando se trata da relação entre modalidades esportivas e níveis de autoconfiança. No entanto, Becker Jr. (2000) explica que nos esportes individuais, os atletas não compartilham a responsabilidade, expondo-se sozinhos a uma avaliação direta dos expectadores. Isso faz com que os atletas de modalidades individuais, apresentem maiores níveis de ansiedade e menores de autoconfiança se comparados aos atletas e modalidades coletivas. Observa-se ainda que a presença dos companheiros de equipe diminui a responsabilidade individual diante dos resultados das competições, o que explicaria o aumento do nível de ansiedade dos atletas em esportes individuais (GONÇALVES e BELO, 2007).
As diferenças entre homens e mulheres sempre foram e ainda são objeto de estudo das mais diversas áreas do conhecimento e no esporte não é diferente. O estudo de Lavoura, Botura e Machado (2006), verificou que as atletas do sexo feminino apresentaram, em situações pré-competitivas, menores níveis de autoconfiança e maiores níveis de ansiedade se comparadas aos atletas do sexo masculino. Além de que os homens atingiram um desempenho mais satisfatório do que as mulheres no conjunto de atividades propostas pela competição esportiva. Para tanto, Martens (1987) levanta a hipótese de que as mulheres não têm tanta experiência quanto os homens no esporte, sendo assim apresentam maior nível de ansiedade e menor de autoconfiança. No estudo de Cox et al., (1996), com atletas chineses e americanos das modalidades atletismo, basquete, vôlei e natação, foram observados um maior nível de confiança e uma maior motivação entre os atletas homens quando comparados às mulheres.
Dada a importância da autoconfiança para o desempenho esportivo dos atletas, torna-se essencial que esta seja desenvolvida possibilitando que o atleta atinja o desempenho esportivo esperado na competição.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A literatura revisada demonstrou que a autoconfiança é uma característica importante a ser desenvolvida por um atleta. Nesses casos, os atletas que possuem maior controle emocional têm a possibilidade de alcançar resultados favoráveis na hora da competição. A autoconfiança contribui para o equilíbrio de variáveis como o estresse e a ansiedade, muito comuns no esporte de alto nível.
Dada a importância da autoconfiança para o desempenho esportivo, entende-se a preparação psicológica como um diferencial em competições na qual os atletas possuam qualidades físicas, técnica e táticas semelhantes.
Fonte: www.efdeportes.com
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