4 de fevereiro de 2012

QUEM NÃO REPRODUZ, DENTRO DE SI, O MUNDO QUE O GERA?

Quantas vezes fui um ditador? Quantas vezes um inquisidor, um censor, um carcereiro? Quantas vezes proibi, aos que mais queria, a liberdade e a palavra? De quantas pessoas me senti dono? Quantas condenei pelo delito de não serem eu? Não é a propriedade privada das pessoas mais repugnante que a propriedade das coisas? A quanta gente usei, eu, que me acreditava tão à margem da sociedade de consumo? Não desejei ou celebrei, secretamente, a derrota dos outros, eu que em voz alta me cagava no valor do êxito? Quem não reproduz, dentro de si, o mundo que o gera? Quem está a salvo de confundir seu irmão com um rival, e a mulher que ama com a própria sombra?

Eduardo Galeano (Dias e Noites de Amor e de Guerra; pág: 194)

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