21 de abril de 2021

A GRAÇA E O FARISEU

Acho incrível o quanto alguns abençoados(as) ignoram as implicações da Graça quando querem explicar o propósito, ou a razão por trás do que acontece no mundo. Por um lado entendo até o quão absurdo pode parecer levar a sério o conceito da Graça, sobretudo, aos olhos dos que creem na dicotomia do "aqui se faz, aqui se paga", ou no "se Deus dá a vida, ele também tira", como se em tudo operasse uma força que tornasse, de algum modo, justo tudo o que acontece. Para esses, a vida misteriosamente funciona num perfeito equilíbrio. A rigor, se algo aconteceu, aconteceu porque tinha que acontecer — Deus permitiu. Se não aconteceu, é porque não tinha que acontecer — Deus não permitiu. Genial. É uma forma, definitivamente, preguiçosa de fazer com que, absolutamente, tudo, numa tacada só, faça sentido. Uma espécie de epifania barata, que para lidar com ela basta aceitar que tudo faz parte de um plano fadado a concretizar-se. O grande destino, a grande promessa é apenas uma questão de tempo, crença ou fé. Na verdade, isso não importa porque o grande desígnio divino deve-se cumprir, quer queira ou não. Aceite que você não tem a capacidade de frustrar os planos de "Deus".. Porém, se isso se sustenta diante da contingência ao redor, é outra história. Se você abandonou esse curso de "como se tornar um fariseu" e levantar a cara da Bíblia e lançar um olhar genuinamente para os outros — não um olhar interesseiro, como quem olha alguém a ser convertido, ou se a tirar do pecado -, não terá muita dificuldade em perceber que desde que o mundo é mundo, sempre estivemos sob as mesmas regras, seja você quem for. Se isso parece trágico demais, provavelmente você se sente mais especial do que os outros, aos seus semelhantes, ao próximo. Enfim, nada que uma criança, diante dos pais, nunca tenha sentido antes.

"Ele faz raiar o seu sol sobre maus e bons e derrama chuva sobre justos e injustos." (Mateus 5:45)

O conceito de Graça é desprezado, em parte, porque minaria, em boa medida, valores por trás de práticas — tão presentes na maioria das instituições cristãs — que são baseadas na lógica de troca e numa relação de cegueira completa da camada contingencial presente no tecido de grande parte dos acontecimentos. O que se vê na maioria das igrejas é a pregação sonolenta — embora gritada — de que é preciso aderir uma postura diante do mundo sob pena de perdermos algo que Deus reservou. Nesse intuito vale todo tipo de apelo emocional, até de técnicas usadas no marketing com intuito de gerar certos anseios, como o gatilho da "escassez", presente, por exemplo, no conhecido: "Jesus está voltando!", como quem diz: "arrependa-se enquanto tempo", ou: "sua glória está por vir". Enfim, toda aquela postergação que só faz sentido no pós túmulo.

O ponto agora é que essa renúncia "às coisas do mundo" tão orgulhosamente assumida por quem passou a acreditar estar mais próximo de Deus — isto é, os que acreditam que se encontram numa relação mais justa sobre os seus deveres e direitos para com o Reino de Deus — perderia o sentido, uma vez que a Graça — como o nome sugere — pressupõe a inexistência de determinados requisitos para se ter o que Deus tem a oferecer. Por isso a Graça é absurda. Absurdo para nossos padrões, que tendemos — e não tem como ser de outro jeito — a interpretar Deus a partir da condição humana, então, acabamos por simplificá-lo à nossa imagem e semelhança, reduzindo-o assim aos parâmetros que temos a capacidade de ter. Acabamos por misturar tudo na interpretação: nossa personalidade, emoções, ressentimentos, frustrações, intelectualidade e toda a sorte de viés quando abrimos a boca para falar de Deus. Mas, no final, o que sempre temos é o Deus que merecemos, porque invariavelmente temos o Deus que nós mesmo construímos para si.

Não surpreende que alguns acabem por assumir um certo pensamento mítico, que o mesmo, sem pudor, é o que dá carta branca aos impulsos paranoicos, resultando até mesmo numa predisposição tosca em acreditar que temos o poder de mobilizar um Deus, UM DEUS!, e, como se não bastasse, o processo se dá através de insignificâncias humanas que alguns tanto se vangloriam, alguns deles são: jejuar, não beber, ler a Bíblia, louvar ou pregar a palavra (com perturbação sonora), morrer de agradecer, perdoar em nome de Deus, ou, nas versões mais duras, até mesmo se chicotear, mutilar etc, como se não tivéssemos nada melhor para oferecer. Só pode haver uma moral torpe por trás desse tipo de comportamento, uma prepotência sem sentido que busca excessivamente sentido no mundo, além de remontar a uma antiga relação de demonização e desprezo pelo corpo e a consagração do espírito. Na prática, o que se faz é ser mesquinho em nome de Deus. Duvido muito que seja o melhor modelo para uma existência digna, sobretudo, se pressupõe-se que o tal Deus, seja afeito a algo como o amor.

Se você foi picado por esse mosquitinho da religião, tudo bem. A viagem pode ser incrível. Assim como pode ser quando — não tanto quanto — você mergulha no universo da arte. E sabe o que os melhores do esporte, da música ou de qualquer outra arte fazem? Eles se inspiram nos melhores de suas modalidades. Até onde eu sei o melhor cara a se espelhar quando o assunto é cristianismo — pasmem — é ele mesmo: Jesus Cristo. O que de fato não acontece entre a maioria dos "cristãos".. Mas eis um belo ponto de partida.

Diego Cosmo

ROCK ROOTS FOREVER


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Nada mais, nada menos do que aquele velho, bom e eterno Rock & Roll!

20 de abril de 2021

PUNK AND PUNCH!

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Simplesmente megaputaqueparivelmente! ;)

15 de abril de 2021

ENTRE APARÊNCIAS

Entre como se vive e como se devia viver há tamanha diferença, que aquele que despreza o que se faz pelo que se deveria fazer aprende antes a trabalhar em prol da sua ruína do que da sua conservação. Na verdade, quem num mundo cheio de perversos pretende seguir em tudo os princípios da bondade, caminha para a própria perdição. (...) A um reputam-no pródigo, a outro ganancioso, a este cruel, àquele piedoso, a estroutro desleal, àqueloutro fiel, a um efeminado e pusilânime, a outro feroz e destemido, a um modesto, a outro soberbo, a um lascivo, a outro casto, a um íntegro, a outro astuto, a um inflexível, a outro brando, a um austero, a outro leviano, a um religioso, a outro ímpio, e assim por diante. Todos hão de achar, bem sei, que seria muito louvável possuísse um príncipe, dentre as qualidades mencionadas, somente as boas. Não sendo, porém, possível telas todas nem observá-las integralmente, porque não o permitem as condições humanas, cumpre-lhe ser bastante cauteloso para saber furtar-se à vergonha das que lhe ocasionariam a perda do estado e, em certos casos, também à daquelas que não lha ocasionariam, embora estas menos receio lhe devam inspirar. Releva, deste modo, que não tema incorrer na infâmia dos defeitos mencionados, se tal for indispensável para salvar o estado. É que, ponderando bem, encontrará algo com aparências de virtude [virtù], cuja adoção lhe trará a ruína, e algo com aparência de defeito, que o conduzirá a uma situação de segurança e de bem-estar.

Nicolau Maquiavel (O Príncipe; págs: 139, 140 e 141)