24 de outubro de 2012

DEUSES

Será isto que é a alma, a ausência que mora em mim, e faz o meu corpo tremer. Não me canso de repetir esta coisa linda que disse Valéry: "Que seria de nós sem o auxílio das coisas que não existem?" Estranho isso, que o que não existe possa ajudar... Deus nos ajuda, mesmo não existindo: este o segredo da sua onipotência. Teologia é um encantamente poético, um esforço enorme para gerar deuses... Que deuses? Os meus, é claro. São os únicos que me é permitido conhecer. Lembro-me de Feuerbach. Compreendeu que estamos destinados ao nosso corpo, especialmente os olhos. Vemos. Mas em tudo o que vemos encontramos os contornos da nossa própria nostalgia, o rosto da alma. Como Narciso, que se enamorou de sua própria imagem refletida na superfície lisa da fonte. Também nós: o universo sobre que falamos é a imagem dos nossos cenários interiores. Com o que concorda a psicanálise, e antes dela o Evangelho: a boca fala do que está cheio o coração. Nossos deuses são nossos desejos projetados até os confins do universo. "Se as plantas tivessem olhos, capacidade de sentir e o poder de pensar, cada uma delas diria que a sua flor é a mais bela." Os deuses das flores são flores. Os deuses das lagartas são lagartas. Os deuses dos cordeiros são cordeiros. E os deuses dos tigres são tigres... Tudo é sonho. Ou, como diz Guimarães Rosa: "Tudo é real porque tudo é inventado".

Rubem Alves

A BONDADE VEM DA FORÇA

Olhe ao seu redor - as pessoas que você acha boas, quase sempre são fracas. A bondade delas não vem da força, vem da fraqueza. Elas são boas porque não ousam ser más. Mas que tipo de bondade é essa que vem da fraqueza? A bondade tem de surgir de uma força transbordante, só então é boa porque ela é vida, um fluxo de vida. Assim, sempre que um pecador se torna santo, sua santidade tem sua própria glória. Mas sempre que um homem comum se torna santo por causa da sua fraqueza, sua santidade é pálida e morta, não existe vida nela. Um homem que é bom porque não pode ser mau, não é realmente bom. No momento em que se tornar forte, será mau; dê-lhe o poder e imediatamente estará corrompido.

B.S. Rajneesh

19 de outubro de 2012

FOME E SEDE DE VIVER

Agora, com fome e sede de viver, numero os dias que imagino faltarem. Tenho pressa - devoro todos os livros, escuto todas as músicas, vejo todos os filmes, recito todos os poemas, corro todas as maratonas. Penso que será melhor acabar a carreira cansado do que enfastiado ou amargurado. Garimpo amigos com fome de vida. Tento encontrar gente que vive adiante do seu tempo - meu jeito de querer antecipar o futuro. Prometo ser amigo de quem eu possa despejar poesia, repartir anelos e, claro, sonhar sonhos impossíveis. Pretendo nunca apequenar o mundo de ninguém. Voto não portar-me como vampiro. Sei que se repartir com dignidade bons sentimentos, eu também somarei alegrias. E assim, partilhando nossas biografias, jamais pensarei em outra coisa se senão viver e gerar vida. 
 
Ricardo Gondim

7 de outubro de 2012

PREITO AOS LIVROS


Entendi o porque sou materialista quanto aos livros.. É porque há uma relação íntima, já passei madrugadas inteiras junto a maioria dos livros que li. Geralmente são encontros diários que duram de 3 a 10 dias, depende do livro, mas que sempre deixam sua marca, sempre encarnamos algo do papel. Ao passar cada página é um beijo com o dedo salivado, a cada anotação um diálogo a mais, a cada grifo um elogio. Depois de muitas e muitas emoções, guardo na estante como se fosse um retrato para sempre lembrar dum monte de coisa, inclusive o que somos.

Diego Cosmo