Em grande parte, depois de conviver por décadas com gente santa, só fui conhecer Jesus pessoalmente através dos pecadores. Não fui encontrá-lo na igreja, onde insistíamos que ele morava e onde falávamos metade do tempo sobre ele. Na igreja encontrei meus amigos mais bem-intencionados, muitos deles assustadoramente queridos e carentes, mas oprimidos como eu debaixo de um sistema fundamentado em medo e desejo. Por mais que eu simpatizasse com o calor da instituição e com o mérito das boas intenções, nada eu testemunhava ou vivia da satisfação inerente, a generosidade, a paixão e a terrível liberdade que os evangelhos atribuíam ao Filho do Homem. Cantávamos, chorávamos e nos abraçávamos debaixo do mesmo teto piedoso, mas ali não estava o espírito de Jesus.
Como eu suspeitava, os pecadores não se entregam como nós na igreja a pecados mesquinhos como a hipocrisia, a mentira e o orgulho; abrem eles mão desses amadorismos e tratam da coisa em si, da sem-vergonhice mais vital, sensorial e carnal - sexo, drogas e rock 'n' roll. Não esperava encontrar entre os pecadores, e pela primeira vez na vida, a terna experiência do espírito de Jesus. Não em mim. Neles. Os evangelhos atribuem ao Filho do Homem tremendas paixões, vitalidade, generosidade e independência; o livro de Atos e as cartas falam de cristãos que "tinham tudo em comum" e "eram de um só coração". Em seus momentos mais idealistas Jesus fala em amar os inimigos, dar a outra face, emprestar sem esperar receber de volta, oferecer um banquete a quem não tem como retribuir. Paulo descreve um mundo sem preconceito de sexo, raça ou classe social. João garante que Deus é amor, e que o amor abre mão de qualquer traço de temor. Paradoxalmente, este mundo definido em termos positivos poucos cristãos chegam em qualquer medida a experimentar. Escolhemos nos definir não por essas qualidades afirmativas - aquilo que o apóstolo chama de "Fruto do Espírito" - mas pelo que é negativo e paralisante e opressor contra os outros e nós mesmos: a culpa, a mesquinhez, a repressão, a neurose, a negação, o niilismo. O mundo em que todos se aceitam e se amam, embora faça parte da nossa pregação nominal, nos é aterrorizante por natureza. Tudo em nossa postura batalha contra ele. A "gloriosa liberdade dos filhos de Deus" não nos interessa. Alguém me dê depressa um líder carismático e um rol muito claro de mandamentos - é só o que pedimos.
Entre os pecadores encontrei um universo livre da superficialidade de igreja e da irrelevância burguesa da faculdade. Aqui estava um mundo que escolhia se definir, na prática e não a partir de qualquer discurso ou demagogia, pela aceitação e pelo amor. Aqui estava gente que tinha tudo em comum, até mesmo - onde está, Mamom, a tua vitória? - o dinheiro. Gente que ignorava rótulos de classe, sexo e conta bancária para se tratar como gente no sentido mais fundamental da coisa. Gente que se recusava a ser manipulada pelo desejo e pelo temor, e o fazia entregando-se a um e mandando às favas o outro. A comunhão que experimentam, descobri, não tem limites; sua generosidade, que não espera recompensa que não o instante, não tem paralelo. Os pecadores abrem suas portas uns aos outros a qualquer momento do dia ou da noite; repartem sua droga, seu dinheiro, sua casa e seu pão sem nenhum trâmite ou transação, seja com um irmão importuno seja com o desconhecido em que acabam de tropeçar. Emprestam, terrivelmente, sem esperar receber de volta. Carregam quem precisa ser carregado, descolam um trampo para quem precisa, tiram a camisa para quem vomitou na roupa, emprestam a chave do carro para quem não tem onde fumar, providenciam o apartamento de alguém na praia para o que foi expulso de casa, repartem sem chiar ou cobrem o tanque de gasolina. Trabalham tanto para os outros quanto para si, acolhem com graça incondicional; são compassivos até para com os que não o toleram, longânimos com os que todos já decidiram ser melhor rejeitar. Convivem sem traumas com a consciência, apavorante para nós, de que não são melhores que ninguém.
Entre os pecadores não transita apenas a legitimidade de quem se recusa a ter o que esconder; rola, senhoras e senhores, um amor - e tão forte que lança fora todo o medo. São gente boa no sentido afirmativo da coisa. Gente sensualista, mas raras vezes desonesta. Autoindulgente, mas sempre generosa. Pecadora, mas não proselitista. Matam-se, mas o que fazem pelos outros é só resgatar. Morrem, mas abraçados. Não é difícil entender porque Jesus curtia tanto a companhia dos pecadores e não escondia seu orgulho em associar-se a eles. A integridade existe e a verdadeira comunhão não é uma impossibilidade: os pecadores legítimos não as desconhecem. Louvados sejam nas alturas os grandes pecadores, porque uma porção fundamental de Jesus sobrevive na Terra apenas através deles.
4 comentários:
Eita que esse Paulo Brabo tá virando o profeta dos MMIS (Movimento dos Molestados por Igrejas Sacanas). Pobre Rubem Alvez, perdeu a majestade! kkkkkkkkkkk
Só uma ressalva, num tá faltando alguém nessa mesa não?
:-P
abraço cara!
hehehe! Boa idéia! Apoio esse movimento aí xD embora eu não tenha permitido que eu fosse muito molestado por ela mas conheço gente que ainda é e foi...
Rapaz... nessa mesa falta e já tem muita gente mas aqui é que nem a topique 05, sempre cabe mais um hehe
abraço meu brother
Ei mah, virou santo foi ?! hehe
Nao anda mais na roda dos pecadores .. rsrs
Aparece aew valeu !
Pelo menos metade da minha família precisava ler isso...
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