27 de maio de 2016

A IRONIA DA BUSCA PELA PAZ ATRAVÉS DAS ARMAS

Ainda são as mais antigas ironias que nos trazem maior satisfação: o homem, ao se preparar para uma guerra sangrenta, prega em alto e bom som, da maneira mais eloquente, a paz. Essa dicotomia não é uma invenção do século 20. No entanto, foi nesse século que a maioria dos exemplos mais marcantes desse fenômeno apareceu. Nunca antes o homem verbalizou tanto sua busca pela harmonia global enquanto reunia pilhas e mais pilhas de armas de efeito devastador. A Segunda Guerra - assim nos disseram - foi a "guerra para acabar com todas as guerras". O desenvolvimento da bomba atômica é a "arma para acabar com as guerras".

E no entanto as guerras continuaram. Atualmente, não há nação neste planeta que não esteja envolvida em alguma forma de conflito armado, se não contra seus vizinhos, contras as forças internas. Além do mais, à medida que quantias cada vez maiores de dinheiro são derramadas em buscas pela arma ou conflito específico que trarão a paz duradoura, o esgotamento de nossas economias cria uma paisagem urbana arruinada onde o crime floresce e as pessoas estão cada vez menos preocupadas com a segurança nacional e mais com a simples segurança pessoal, necessária para poder ir ao mercado tarde da noite comprar um litro de leite sem ser assaltado. Os lugares que lutamos tão ferozmente para preservar estão se tornando cada vez mais perigosos. As guerras para terminar com todas as guerras e as armas para terminar com as guerras são coisas que falharam completamente.

Alan Moore (Watchmen - edição definitiva: Capítulo 4: pág: 138)

SOMBRIO BRILHANTE

"Laurie, eu tenho 65 anos. A cada dia, o futuro parece mais sombrio, mas o passado, mesmo as piores partes... ...bom, ele vai ficando cada vez mais e mais brilhante."

"Comecei a me indagar o que gostaria de fazer agora que a emoção da aventura finalmente esmaecia. Revendo minha vida, tentei discernir o que fiz durante os momentos mais felizes de minha existência, a fim de formar uma base para minha satisfação futura."

Alan Moore (Watchmen - edição definitiva; págs: 44 [Cap. 2] e 106 [Cap. 3])

13 de maio de 2016

COMO FAZER A INTERNET SER PAGA

Quem controla os fios ou as ondas aéreas pode controlar a internet, pois apenas através dessas conexões ela pode existir e operar. Para usar um sistema de busca e outros utilitários é preciso acesso à internet, e este é um serviço que empresas como Amazon ou Google não fornecem (com exceções triviais). Para dispor de acesso é necessário pagar a um provedor de internet - em geral uma companhia telefônica ou de cabo.

A AT&T e suas aliadas já tinham um plano. Elas começariam a oferecer um serviço de internet de "pista rápida" para clientes selecionados (isto é, os que quisessem pagar por ele), pressionando assim para que as empresas de cabo e a Verizon fizessem o mesmo. Por exemplo, a AT&T poderia fechar um acordo para tornar o Yahoo! seu mecanismo de busca oficial, colocando-o à frente dos rivais em troca de pagamento; ou obrigar a Netflix a pagar para que os consumidores baixassem filmes mais depressa.

De todo modo, por trás da proposta de uma banda larga sempre estava implícita a ameaça de penalização ou degradação de serviços para quem não quisesse ou não pudesse pagar. Por essa razão, não passou despercebido a ninguém que, ao exercer o papel de acelerar algumas empresas e desacelerar outras, a AT&T e as companhias de cabo estavam assumindo um poder de vida e morte sobre o comércio na internet. (...) Esse tipo de embate lobista em geral é complexo demais para atrair o interesse da mídia, principalmente das redes de televisão.

Tim Wu (Impérios da Comunicação; págs: 342 e 343)

WWW.INTERNET


O nome Internet vem de internetworking (ligação entre redes). Embora seja geralmente pensada como sendo uma rede, a Internet na verdade é o conjunto de todas as redes e gateways que usam protocolos TCP/IP. Note-se que a Internet é o conjunto de meios físicos (linhas digitais de alta capacidade, computadores, roteadores etc.) e programas (protocolo TCP/IP) usados para o transporte da informação. A Web (WWW) é apenas um dos diversos serviços disponíveis através da Internet, e as duas palavras não significam a mesma coisa. Fazendo uma comparação simplificada, a Internet seria o equivalente à rede telefônica, com seus cabos, sistemas de discagem e encaminhamento de chamadas. A Web seria similar a usar um telefone para comunicações de voz, embora o mesmo sistema também possa ser usado para transmissões de fax ou dados.

World Wide Web [WWW] é uma função da Internet que junta, em um único e imenso hipertexto ou hiperdocumento (compreende imagens e sons), todos os documentos e hipertextos que a alimentam.

Pierre Lévy (Cibercultura; págs: 27 e 265)


É comum confundir Web e internet - muitos usam os termos de maneira alternativa -, mas a primeira é simplesmente uma das mais populares aplicações da rede (o e-mail é outra). A internet movimenta a informação de um lugar para outro, mas são suas aplicações como a Web que determinam o que pode ser feito usando-se a Internet. Acessada por um navegador, a Web originalmente não passava de um acordo para armazenar toda a informação num formato comum (HTML), combinado com maneiras de conectar pedaços de informação por intermédio dos chamados hiperlinks. O valor supremo da Web era, e ainda é, sua universalidade. É esse princípio de universalidade que faz a web ter tamanha potência em questões comerciais e de livre expressão.

Tim Wu (Impérios da Comunicação; págs: 338 e 339)

APPLE E WINDOWS


Ainda que Jobs [Steve Jobs] tenha construído lindas máquinas, sua decisão de fechar o Macintosh contribuiu muito para fazer de Bill Gates o homem mais rico do mundo. O Windows apresentava uma vantagem insuperável: funcionava em qualquer computador, admitia qualquer tipo de software e tinha interface com qualquer impressora, modem ou outro hardware. O Windows ficou com o mercado em que a Apple fora pioneira baseando-se nas ideias com que ela começara.

Tim Wu (Impérios da Comunicação; pág: 335)

A HISTÓRIA DA AOL COM A INTERNET


Em 10 de janeiro de 2000, os dois [Steve Case e Gerald Levin] estavam numa coletiva de imprensa anunciando um revolução: a fusão de 350 bilhões de dólares entre a maior companhia de mídia do mundo e a maior empresa de internet. A AOL seria o motor que levaria as velhas holdings de mídia da Time Warner - um tesouro do que veio a ser conhecido como "conteúdo" - ao mundo novo. (...) Não é preciso ser gênio para fazer uma análise retrospectiva e perceber as limitações de um portal sem uma ferramenta de busca e que oferecia o conteúdo de uma só empresa. (...) Não havia um lugar lógico para a AOL na era da banda larga. (...) O principal fato é que a AOL tinha chegado à maioridade antes da internet de massa. No início dos anos 1990, você não discava a fim de surfar em liberdade, mas para acessar a própria AOL e falar com outros usuários da AOL. Talvez seja um fato difícil de entender para quem nasceu e se criou com a internet, porém, naqueles primórdios, a AOL era a plataforma; no jargão, operava como um "jardim murado" para os usuários.

Nos anos 1990, quando a internet começou a crescer em popularidade nos campi universitários, umas poucas empresas criativas passaram a oferecer serviço de internet em casa. Sua popularidade acabaria forçando a AOL a mudar o modelo de negócios, de modo a fornecer a seus milhões de usuários acesso direto à internet, e não só ao jardim murado da AOL. Foi uma decisão tomada com relutância, pois Case e seus colegas sabiam que o acesso à internet lhes custaria o controle sobre os clientes. Não obstante, com os novos provedores de serviço de internet beliscando seus calcanhares, a AOL deixou de ser sobretudo uma empresa de serviços online para se tornar principalmente um provedor de serviços de internet. No início, durante os anos 1990, a estratégia funcionou muito bem. Todo mundo queria saber o que era a internet, e a AOL era a maneira mais fácil de chegar lá, porque ela postou um CD nas caixas de correios de todo mundo (o valor de exemplares gratuitos foi uma das coisas que Case aprendeu em sua carreira anterior como gerente de marketing da P&G). Nesse sentido, a AOL foi uma parte importante da revolução de massa da internet.

O problema para a AOL na passagem dos anos 1990 para os 2000 foi que já havia no horizonte uma nova maneira de acessar a internet: a banda larga. As companhias de cabo e telefone conseguiram obter velocidades mais altas a partir das antigas fiações e linhas telefônicas, e agora ofereciam aos clientes uma conexão de internet rápida e direta. O problema era que, já no projeto, o serviço de banda larga tornava a AOL desnecessária. O modelo de negócios desta tinha como premissa a "discagem" - conectava-se à AOL para chegar à internet. Com o novo Digital Service Lines (DSL) e de banda larga, as companhias telefônicas e de cabo ofereciam aos clientes a internet direta, eliminando provedores de serviços como a AOL. (...) Em 2000, a AOL era vista como a empresa da "nova mídia", a revigoradora da "velha mídia" fóssil - o destino temido por Levin para a Time Warner. Mas, na verdade, ela era um dinossauro mancando em direção à nova era. Obter suas próprias linhas de cabo era uma questão de vida ou morte, e a fusão com a Time Warner era uma maneira de conseguir isso. De modo mais cínico, pode-se dizer que Steve Case, que compreendeu os problemas da AOL, escolheu esse momento para capitalizar as ações literais e figurativas da empresa na hora em que elas não podiam subir mais. Um ano depois da fusão, com a emergência das empresas ponto com, a AOL estava valendo bem menos que os 240 bilhões de dólares do auge de sua existência. 


Em 2000 ela já era menos uma destinação em si - a plataforma que fora - e se tornara só a maneira mais popular de acessar a rede. Embora pudesse alardear seus 30 milhões de assinantes, ela não conseguia exercer um controle significativo sobre eles. Uma vez on-line, o usuário podia ir aonde quisesse, pois a internet era capaz de conectar duas pessoas quaisquer, fossem elas quem fossem. O surgimento de ferramentas de busca e nomes de domínios apenas exacerbaria o problema. (...) No máximo, a AOL podia recomendar o conteúdo da Time Warner. (...) Em 9 de dezembro de 2009, a apenas um mês do 10º aniversário, o desastroso casamento da AOL com a Time Warner terminou em divórcio.

Tim Wu (Impérios da Comunicação; págs: 310, 313, 314, 315, 316, 319 e 321)

A INEVITABILIDADE DO CICLO

Será que a internet prenunciaria um reinado de abertura industrial sem fim (...) Ou será que, apesar de seu projeto radicalmente descentralizado, se tornaria, com o tempo, o próximo alvo lógico das insuperáveis forças do império da informação [?] (...) Será que a internet é diferente de fato? Todas as demais invenções do mesmo tipo tiveram um período de abertura só para se tornar a base de outros impérios da informação. O que é mais forte: o radicalismo da internet ou a inevitabilidade do Ciclo? (...) Ainda resta ver o quanto a internet permanecerá aberta, mas há poucas dúvidas de que a estrutura industrial monopolista que caracterizou o século XX afinal já fincou o pé na rede. Seja qual for a noção anterior, de que a internet, por sua natureza, estava imune à monopolização, o presente já deixou claro a loucura do excesso de otimismo. O Ciclo mais uma vez está em movimento. (...) Na mitologia hindu, demônios e deidades assumem diferentes encarnações para lutar sempre as mesmas batalhas. No início dos anos 2010, ficou claro que a batalha pelo futuro da internet era apenas a mais recente reprodução da perene luta ideológica para a qual toda a indústria de informação acaba sendo arrastada. É o velho conflito entre o grande e o pequeno, entre os conceitos de sistema aberto e fechado, entre as forças de ordem centralizadora e as da variedade dispersa. Os antagonistas assumem novas formas, os generais mudam, mas são essencialmente as mesmas batalhas travadas mais uma vez. Esta é a própria essência do Ciclo, e mesmo uma tecnologia tão radical e poderosa como a internet só é capaz de moderá-la, não de aboli-la.

Tim Wu (Impérios da Comunicação; págs: 19, 308, 328 e 346)

11 de maio de 2016

A INFORMAÇÃO SE TORNA MAIS VALIOSA QUANTO MAIS FOR USADA

O problema desses filmes como proposta de negócio é claro: seu valor não vem de uma marca subjacente. Uma produção como Cleópatra faz dinheiro ou não (não fez - apesar de ter sido a maior bilheteria de 1963!). Mas não deixa o espectador com vontade de consumir produtos a ele relacionados quando a experiência termina. Como instrumento de propaganda, perde a atenção da plateia. Em comparação, um filme como Transformers ou Homem de Ferro não fatura só na bilheteria: está provado que leva a vendas de brinquedos, revistas em quadrinhos e, claro, sequências. (...) Ao contrário de qualquer outra mercadoria, a informação se torna mais valiosa quanto mais for usada. (...) Cada vez que você murmura a palavra "Coca-Cola", "McDonald's" ou "Nike" está fazendo um pequeno serviço de marketing ao proprietário da marca. (...) As leis de propriedade intelectual e de marca registrada são uma forma de ganhar e lucrar com alguns significantes. Não se pode ser proprietário de Hitler ou da imagem de um polvo gigante. Mas é possível ser dono de Darth Vader, do Batman ou da Pantera Cor-de-Rosa graças às leis federais de propriedade intelectual.

Ele [Edward Jay Epstein] diz que, mais ou menos desde os anos 1990, os estúdios deixaram de considerar as receitas de bilheteria a medida mais importante do "desempenho" de um filme, pois o risco da bilheteria é assumido por parceiros externos. A receita que mais conta para os estúdios, de acordo com Epstein, vem do resto, incluindo a difusão do produto em mídias diferentes (DVD, pay-per-view a cabo, downloads etc.) e lançamentos em cinemas ao redor do mundo. Contudo, a grande fatia do lucro depende dos direitos autorais dos personagens, resultantes de merchandising, subprodutos, direitos de continuação e outros "trabalhos derivativos" (...) O modelo básico inventado pela Disney nos anos 1960, quando os irmãos Disney se deram conta de que seus filmes podiam criar clientes para suas mercadorias e seus parques temáticos, que por sua vez os levariam de volta aos filmes - estratégia rotulada como "merchandising total" (...) cujo verdadeiro valor nunca vem a público. Esse tipo de arranjo, segundo Epstein, faz dos estúdios de hoje mais uma operação de licenciamento que um empreendimento cinematográfico. Ele desenvolve propriedades valiosas e ganha dinheiro licenciando-as na mais abrangente multiplicidade de formas possível. Essa visão de como produzir filmes está muito longe da essência do cinema na época em que os estúdios nasceram. O que quer que Michael Cimino tivesse em mente quando criou O portal do paraíso, não fazia parte da ideia marcar com ferro e fogo a consciência popular.

O estúdio acabou investindo 175 milhões de dólares na produção [do A volta do todo-poderoso] (...). No popular site de resenhas Rotten Tomatoes, o filme conseguiu uma constrangedora taxa de apenas 8% de respostas positivas. Apesar de uma grande campanha de marketing e da estreia nacional em 5.200 cinemas, A volta do todo-poderoso faturou somente 30 milhões de dólares ou algo assim no primeiro fim de semana, coisa ridícula para os padrões dos grandes lançamentos. (...) E aí aconteceu o milagre: a bomba explodiu, mas não causou danos. A United Artists não entrou em colapso e houve poucas consequências para os envolvidos. A vida continuou como sempre na Universal e, mais importante ainda, na General Electric. O fracasso de A volta do todo-poderoso, um genuíno desastre para a Universal, foi assimilado pelo desempenho da GE, que teve uma receita de 168 bilhões de dólares naquele ano.

Em resumo, o fracasso imediato ficou impune. Até mais notável, com o tempo, as vendas de DVD e a exibição em cinemas no exterior fizeram com que a produção afinal se pagasse, mesmo que ninguém tivesse algo de bom a dizer a seu respeito. Fosse um tipo de filme sujeito a rendimentos de merchandising e licenciamento, é possível que desse um belo lucro, apesar de ser definitivamente ruim como filme. (...) Assim, A volta do todo-poderoso é a prova de quanto a estrutura dos estúdios está garantida no momento. A mediocridade pode gerar mais mediocridade, só que com segurança: eis o verdadeiro milagre da moderna indústria de entretenimento.

Tim Wu (Impérios da Comunicação; págs: 276, 277, 278, 279, 280, 285, 286 e 314)

DISTRIBUIÇÃO DE RISCO E SUCESSO


Quando se trata de um produto de entretenimento - se comparado com meias ou cervejas, digamos -, vende-se algo de que as pessoas não precisam; elas devem desejar. Estão dispostas a investir tempo e dinheiro - noventa minutos num filme, 25 dólares num livro - sem a menor certeza de satisfação ou sobre o efeito desejado. (...) O resultado é que qualquer livro, filme ou programa de TV é lançado em meio à incômoda sensação de que pode ser um fracasso total e absoluto. (...) Essa incerteza e a variação da demanda no cerne da indústria de entretenimento levaram a uma ampla gama de contramedidas. Como veremos, a estrutura da indústria de entretenimento não faz sentido se não entendermos as maneiras de administrar o risco. Esse espectro, que vai do óbvio - apostar em astros conhecidos ou em diretores (em geral, nos astros) e nas continuações (sequências de sucessos passados, na esperança de que o raio caia duas vezes no mesmo lugar) - a sistemas de certa forma esotéricos de administração financeira e conta conjunta, tem o objetivo de distribuir sucessos e fracassos num orçamento abrangente. Todas essas técnicas têm em comum a forma como acabam alterando a face da cultura americana e da cultura global. (...) Como dissemos, discos, programas de TV, livros e noticiários estão todos sujeitos à vicissitudes das indústrias que precisam "acertar na mosca". Reunir um grupo de empresas de mídia é uma forma de partilhar os riscos e benefícios em diversas plataformas, como um romance best-seller que ajuda a equilibrar um fiasco cinematográfico, para chegar a um fluxo estável de rendimentos. Mas, para se defender de bombas da magnitude de O portal do paraíso, o truque de Ross foi bancar as incertezas dos produtos de entretenimento como um todo com fontes de rendimentos mais confiáveis. O guarda-chuva da Warner Communications abrigava não apenas filmes e música, mas também estacionamentos, aluguel de carros e agências funerárias (o antigo negócio de Ross).

Tim Wu (Impérios da Comunicação; págs: 266, 267 e 269)


Ao aumentar o número de seus integrantes, esses grupos de animais não só dividem a atenção dos inimigos como também reduzem, significativamente, a probabilidade de que cada membro individual se transforme na refeição do dia. A longo prazo, essa estratégia distribuída de administração de riscos aumenta a chance de perpetuação da espécies que vivem a rotina de ser sempre a caça, todos os dias de sua existência. (...) Quando um conselheiro financeiro nos aconselha a distribuir nossas economias entre diferentes investimentos (caderneta de poupança, imóveis, certificados bancários, ações, ouro etc.), ele está se valendo da mesma estratégia de redução de riscos utilizada por um bando de capivaras; a distribuição do montante total por múltiplos investimentos evita que a queda brusca do valor de um deles (digamos, o do mercado de ações) arruíne seu cliente. Algo a ser evitado a todo custo, pois cliente falido não paga comissões a conselheiros!

Miguel Nicolelis (Muito Além do Nosso Eu; pags: 44 e 45)

DADOS NA INTERNET

Para atingir a meta de uma verdadeira teia universal de computadores era preciso uma linguagem também universal. Essa linguagem atende pelo nome nem tão esperançoso de "protocolo de internet", ou TCP/IP. O lampejo de genialidade subjacente a uma rede que conseguisse interconectar outras redes era o conceito de "encapsulamento". Como disse Cerf [Vint Cerf]: "Nós pensamos naquilo como envelopes." Encapsulamento significa empacotar informações de redes locais num envelope que a internetwork pode reconhecer e direcionar, como os postos de correio, que concordaram em usar os nomes dos países em inglês. No que viria a ser conhecido como TCP (ou Transmission Control Protocol), Cerf e Kahn [Robert Kahn] criaram um padrão para o tamanho da taxa de fluxo dos pacotes de dados, fornecendo aos usuários de computadores uma língua que funcionava entre todas as redes.

Tim Wu (Impérios da Comunicação; págs: 238, 239 e 240)

CONGLOMERADO

Não é possível entender as comunicações nem a indústria cultural norte-americana ou global sem compreender o conglomerado. (...) O conglomerado é a forma organizacional dominante nas indústrias da informação do final do século XX e começo do XXI. (...) O conglomerado pode ser o pior inimigo ou o melhor amigo da economia cultural. Com uma capitalização robusta, oferece às indústrias de informação estabilidade financeira e um grande potencial de liberdade para explorar projetos de risco. Mas, apesar dessa promessa, o conglomerado pode também ser um feitor sufocante e avarento, obcecado em maximizar o potencial de receita e de fluxo de sua propriedade intelectual. No seu pior aspecto, essa organização pode levar a lógica da produção cultural de massa a qualquer extremo de banalidade, desde que pareça financeiramente viável, remetendo ao que Aldous Huxley previu em 1927: uma máquina que aplica "todos os recursos da ciência para que a imbecilidade floresça".

Tim Wu (Impérios da Comunicação; pág: 264)

MÍDIA DE MASSAS


A era da "mídia de massa", interrompida pela televisão a cabo, foi na verdade um período de homogeneidade cultural sem precedentes. Nunca antes, ou pelo menos nos 64 anos de intervalo entre os anos 1930 e o início dos 1990, tantos integrantes do mesmo pais viram ou ouviram as mesmas informações ao mesmo tempo. Em 1956, a apresentação de Elvis Presley no The Ed Sullivan Show atraiu inacreditáveis 83% dos lares americanos que tinham aparelho de TV. Em 1955, a transmissão do musical Cinderela atraiu 107 milhões de espectadores, quase 60% de toda a população dos Estados Unidos. Ken Auletta, o comentarista de mídia da New Yorker, disse em 1991: "Para nós, a televisão sempre significou três instituições - CBS, NBC e ABC. Elas têm sido a nossa igreja comunal." Talvez as redes de TV no mundo todo tenham sido o sistema de informação mais poderoso e centralizado da história da humanidade. (...) Uma mídia aberta tem muito a seu favor, mas não o poder de unificar o país. Para unir um país, nada melhor que uma mídia de massa centralizado, fato bem compreendido pelos totalitarismos fascista e comunista. Uma mídia aberta acarreta diversidade e fragmentação de conteúdo, fazendo com que as diferenças entre grupos e indivíduos se acentuem, e não com que sejam eliminadas ou reprimidas.

Tim Wu (Impérios da Comunicação; págs: 259 e 260)


O destino da opinião pública encontra-se intimamente ligado ao da democracia moderna. A esfera do debate público emergiu na Europa durante o século XVIII, graças ao apoio técnico da imprensa e dos jornais. No século XX, o rádio (sobretudo nos anos 30 e 40) e a televisão (a partir dos anos 60) ao mesmo tempo deslocaram, amplificaram e confiscaram o exercício da opinião pública. Não seria permitido, então, entrever hoje uma nova metamorfose, uma nova complicação da própria noção de "público", já que as comunidades virtuais do ciberespaço oferecem, para debate coletivo, um campo de prática mais aberto, mais participativo, mais distribuído que aquele das mídias clássicas?

Pierre Lévy (Cibercultura; pág: 131)

GIGANTISMO

Parece haver somente uma causa por trás de todas as formas de miséria social: o gigantismo. Por mais que isso possa parecer uma simplificação, é mais fácil aceitar essa ideia se considerarmos que o gigantismo, ou o tamanho excessivo, é na verdade muito mais que apenas um problema social. ...Sempre que alguma coisa estiver errada, é porque está grande demais.

Leopold Kohr

Tim Wu (Impérios da Comunicação; pág: 243)

10 de maio de 2016

SOU UM MENTIROSO

Ora, sou vaidoso o bastante para acalentar a esperança de deixar alguma herança para a posteridade, e não vejo motivo para abrir mão do direito à liberdade de criação de que outros desfrutam. Como não tenho verdade alguma para registrar, tendo vivido uma vida profundamente monótona, recorro à falsidade – porém uma falsidade de uma variedade mais consistente, pois proferirei agora a única declaração digna de crédito que se deve esperar de mim: sou um mentiroso. Esta confissão é, considero, defesa suficiente contra todas as acusações. Meu assunto, portanto, é o que jamais vi, experimentei ou me foi contado, o que não existe nem poderia concebivelmente existir. Solicito humildemente a incredulidade do leitor.

Luciano de Samósata em Uma História Verdadeira, escrevendo no segundo século da era cristã (125-180 d.C.)

MODEM (MODULADOR/DEMODULADOR)

O aparelho que permite a modulação e desmodulação da informação digital, e que portanto permite a comunicação de dois computadores via telefone, chama-se "modem". Equipamento de telecomunicações que permite a um computador transmitir informações digitais através de linhas telefônicas comuns (sejam elas digitais ou analógicas). Os modems convertem a informação digital armazenada nos computadores em uma frequência de áudio modulada, que é transmitida pela linha telefônica até um outro modem, que executa o processo contrário, reconvertendo a informação para seu formato digital original.

Pierre Lévy (Cibercultura; págs: 35 e 266)


Dennis Hayes, um diletante da informática (a palavra atual é geek) que em 1977 construiu o primeiro modulador/desmodulador (modem) projetado e dirigido para o consumidor, o chamado modem de Hayes.

Tim Wu (Impérios da Comunicação; pág: 230)

Modem de Hayes