27 de março de 2015

VIRTUAL

Devansh Atray
 
A palavra "virtual" pode ser entendida em ao menos três sentidos: o primeiro, técnico, ligado à informática, um segundo corrente e um terceiro filosófico. O fascínio suscitado pela "realidade virtual" decorre em boa parte da confusão entre esses três sentidos. Na acepção filosófica, é virtual aquilo que existe apenas em potência e não em ato, o campo de forças e de problemas que tende a resolver-se em uma atualização. O virtual encontra-se antes da concretização efetiva ou formal (a árvore está virtualmente presente no grão). No sentido filosófico, o virtual é obviamente uma dimensão muito importante da realidade. Mas no uso corrente, a palavra virtual é muitas vezes empregada para significar a irrealidade - enquanto a "realidade" pressupõe uma efetivação material, uma presença tangível. A expressão "realidade virtual" soa então como um oxímoro, um passe de mágica misterioso. Em geral, acredita-se que uma coisa deva ser ou real ou virtual, que ela não pode, portanto, possuir as duas qualidades ao mesmo tempo. Contudo, a rigor, em filosofia o virtual não se opõe ao real mas sim ao atual: virtualidade e atualidade são apenas dois modos diferentes da realidade. Se a produção da árvore está na essência do grão, então a virtualidade da árvore é bastante real (sem que seja, ainda, atual).

É virtual toda entidade "desterritorializada", capaz de gerar diversas manifestações concretas em diferentes momentos e locais determinados, sem contudo estar ela mesma presa a um lugar ou tempo em particular. Para usar um exemplo fora da esfera técnica, uma palavra é uma entidade virtual. O vocábulo "árvore" está sempre sendo pronunciado em um local ou outro, em determinado dia numa certa hora. Chamaremos a enunciação deste elemental lexical de "atualização". Mas a palavra em si, aquela que é pronunciada ou atualizada em certo lugar, não está em lugar nenhum e não se encontra vinculada a nenhum momento em particular (ainda que ela não tenha existido desde sempre). (...) Ainda que não possamos fixá-lo em nenhuma coordenada espaçotemporal, o virtual é real. Uma palavra existe de fato. O virtual existe sem estar presente.

Pierre Lévy (Cibercultura; págs: 49 e 50)

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